sábado, 4 de setembro de 2010

Biomonitoramento


Aeroportos da Alemanha inventaram uma forma incomum de monitorar a qualidade do ar. O Aeroporto Internacional de Dusseldorf e sete outros aeroportos estão usando abelhas como “biodetetives”, e o mel é testado regularmente para verificar a presença de toxinas.
“A qualidade do ar no aeroporto e em torno dele é excelente”, diz Peter Nengelken, que faz a ligação entre o aeroporto e a comunidade. A primeira coleta de mel feita este ano de cerca de 200 mil abelhas foi testada no começo de junho, disse ele, e indicou que as toxinas estão bem abaixo dos limites oficiais, coerentes com os resultados desde 2006 quando o aeroporto começou a trabalhar com as abelhas.
Os apicultores de um clube da vizinhança cuidam das abelhas. O mel, “Dusseldorf Natural”, é engarrafado e oferecido como presente. Reportagem de Tanya Mohn, The New York Times.
O biomonitoramento, ou o uso de organismos vivos para testar a saúde do meio ambiente, não substitui o monitoramento tradicional, diz Martin Bunkowski, engenheiro ambiental da Associação de Aeroportos Alemães. Mas “é uma mensagem muito claro para o público porque é fácil de compreender”, acrescentou.
Volker Liebig, químico do Orga Lab que analisa as amostras de mel duas vezes por ano para o aeroporto de Dusseldorf e outros seis aeroportos alemães, disse que os resultados mostram a ausência de substâncias testadas pelo laboratório, como alguns hidrocarbonetos e metais pesados, e “era comparável ao mel produzido em áreas sem nenhuma atividade industrial”. É necessário uma amostragem durante um tempo bem mais longo para tirar uma conclusão definitiva, diz ele, mas os resultados preliminares são promissores.
Será que as abelhas serão as sentinelas modernas, assim como eram os canários que usados no passado como sinais de alerta para os gases tóxicos nas minas de carvão?
Usar as abelhas como “bioindicadores terrestres” da saúde do meio ambiente é uma abordagem relativamente nova, diz Jamie Ellis, professor-assistente de entomologia no Laboratório de Pesquisa e Extensão sobre Abelhas Melíferas, na Universidade da Flórida em Gainesville. “Todos nós acreditamos que é possível, mas pode ser um pouco cedo para traduzir esses resultados em soluções ou respostas para o mundo real”. Ainda assim, um trabalho semelhante com insetos para medir a qualidade da água tem obtido sucesso há tempos.
Muitos especialistas dizem que as aeronaves não são a única, nem mesmo a principal, fonte de poluição nos aeroportos. Carros, táxis, ônibus e atividades terrestres assim como as indústrias locais costumam ser os principais poluidores.
Não surpreende que Nancy Young, vice-presidente de assuntos ambientais para a Associação de Transporte Aéreo dos EUA, um grupo que reúne as companhias aéreas, defenda a qualidade do ar nos aeroportos. “Os aeroportos não são grandes contribuidores” para a poluição local do ar, diz ela, acrescentando que as emissões da aviação representam “menos de 1% do total do país e normalmente marcam apenas alguns pontos percentuais em qualquer área metropolitana com um aeroporto grande”. Ela disse que os EUA melhoraram a qualidade do ar em seus aeroportos através de normais mais rígidas e da melhoria das técnicas de monitoramento.
Em todo o mundo, houve melhorias semelhantes, diz Steven Lott, porta-voz da Associação Internacional de Transporte Aéreo. Desde os anos 60, as emissões de monóxido de carbono, de alguns hidrocarbonetos, fumaça e óxido de nitrogênio foram reduzidas substancialmente, disse Lott. Os limites para a maioria delas são estabelecidos pela Organização Internacional da Aviação Civil, um órgão das ONU.
“É um desafio para um setor que continua a crescer”, disse Lott. Mas a inústria investiu em desenvolver tecnologias mais limpas para os motores das aeronaves, equipamentos de apoio terrestre e veículos, bem como melhorias na forma de operar os equipamentos. Iniciativas como o Green Teams, por exemplo, permite que consultores do setor visitem as companhias aéreas para identificar e compartilhar formas de reduzir a queima de combustível e as emissões. Mais de 105 companhias já participaram, diz ele.
Ainda assim, alguns grupos comunitários não estão convencidos de que a qualidade do ar nos aeroportos melhorou.
“Está bem pior do que as pessoas pensam”, diz Debi Wagner, membro do comitê Citizens Aviation Watch USA, que mora em Seattle. Ela disse estar preocupada principalmente com a saúde das pessoas que vivem num raio de 4,8 quilômetros dos aeroportos comerciais.
Dois estudos recentes também levantaram questões sobre a qualidade do ar nos aeroportos. Ambos se concentram em pequenos campos de aviação, como o que existe em Santa Monica, Califórnia, que foi estudado em ambos os relatórios. “Os poluentes tradicionais não pareceram ser um problema local”, diz Philip Fine, gerente de medições atmosféricas para a Administração Distrital de Qualidade do Ar da Costa Sul, uma agência reguladora da qualidade do ar na maior parte do sul da Califórnia. “Entretanto, houve problemas com partículas ultrafinas e chumbo.”
Fina, que supervisiona uma rede de mais de 35 estações de monitoramento do ar, foi um dos pesquisadores-chefe de um estudo financiado pela Agência de Proteção Ambiental que deve ser divulgado nas próximas semanas.
Os níveis de chumbo nas emissões de aeronaves que não são a jato não excederam os limites federais, mais estavam significativamente elevados, disse Fine. Níveis altos de partículas ultrafinas, principalmente dos jatos, também são uma preocupação. As partículas têm vida curta, mas como estão em alta concentração e a favor do vento durante a decolagem, elas são especialmente preocupantes para as pessoas que vivem perto de pequenos aeroportos ou que ficam expostas repetidamente, diz Fine.
A maioria dos grandes aeroportos ficam mais afastados das comunidades residenciais, e também têm áreas de transição os separando.
As implicações das partículas ultrafinas na saúde ainda são desconhecidas, mas algumas pesquisas médicas sugerem que elas podem apresentar um risco sério porque as partículas extremamente finas passam facilmente pelas paredes das células e podem penetrar no cérebro ou no sistema circulatório.
Estudos epidemiológicos mostraram que há riscos de saúde por conta dos níveis elevados dessas partículas emitidas por carros e caminhões, uma preocupação para as pessoas que vivem próximas a avenidas movimentadas ou que as usam com frequência, diz Suzanne E. Paulson, professora de ciências atmosféricas na UCLA. Mas “não sabemos quase nada sobre os efeitos das emissões das aeronaves para a saúde” no que diz respeito a essas partículas, disse Paulson. Ela foi pesquisadora-chefe em outro estudo, publicado no final do ano passado no jornal “Environmental Science & Technology”.
O governo federal estabelece parâmetros para poluentes atmosféricos como o ozônio e material particulado, diz Fine, “mas as partículas ultrafinas não são reguladas atualmente”.
A Europa tem limites governamentais de partículas ultrafinas para as emissões veiculares, diz Fine. Emanuel Fleuti, chefe de serviços ambientais para o Aeroporto de Zurique, disse que há preocupações na Europa também.
Enquanto isso, ele diz estar confiante em relação ao trabalho de biomonitoramento que os aeroportos alemães estão fazendo com as abelhas, uma vez que os resultados são consistentes com o monitoramento tradicional da qualidade do ar na Europa. Alguns aeroportos na França, Suécia e Israel também começaram recentemente a trabalhar com abelhas. “Se você olha o mel, está perfeitamente bom”, diz Fleuti, acrescentando que ele costuma pegar alguns potes quando visita a Alemanha. “É um mel bom.”
Reportagem [At German Airports, Bees Help Monitor Air Quality] do New York Times, no UOL Notícias. EcoDebate, 06/07/2010

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César Torres