Apesar do avanço do saneamento básico nos últimos anos, estima-se que 114 milhões de brasileiros ainda não dispõem de sistema de coleta de esgotos. Doenças decorrentes da falta de saneamento básico, como diarreia, estão entre as principais causas das mortes de crianças no País.
Só isso já seria mais do que suficiente para levar os governos brasileiros a investir bem mais do que vêm investindo em saneamento básico, para o País atingir com mais rapidez a meta de universalização, isto é, o atendimento de toda a população com esse serviço.
Mas, além dos prejuízos à saúde da população, a falta de saneamento básico tem também efeitos econômicos nocivos que justificariam até financeiramente a aceleração dos programas de extensão das redes de água e dos sistemas de coleta e tratamento de esgotos. É o que mostra a pesquisa Benefícios econômicos da expansão do saneamento brasileiro elaborada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo e pelo Instituto Trata Brasil, uma organização criada para mostrar a urgência da universalização do saneamento básico.
Com base em estatísticas conhecidas e em comparações de dados de regiões onde os serviços de saneamento básico já atingem quase toda a população e daquelas em que a maioria dos habitantes carece desses serviços, o estudo conclui que a falta de água tratada e de redes públicas de coleta de esgoto reduz a produtividade do trabalhador e, assim, reduz sua renda média. Além disso, a falta de saneamento impõe custos adicionais ao sistema nacional de saúde, impede a valorização do principal bem de muitas famílias de baixa renda (que é sua moradia) e condena à estagnação regiões com alto potencial para o turismo e que poderiam gerar muito mais emprego e renda.
É fato notório que a falta de coleta de esgotos provoca doenças infecciosas que levam ao afastamento das pessoas doentes do trabalho. As pessoas infectadas que permanecem trabalhando têm desempenho inferior ao de seus companheiros, ou seja, têm menor produtividade, pois estão com a saúde abalada. Essa deficiência tem um custo econômico que pode ser avaliado de diversas formas. Segundo a FGV, o prejuízo das empresas com as horas pagas, mas não trabalhadas – por afastamento do trabalhador para tratamento de doenças infecciosas em geral provocadas por más condições de saneamento nos locais onde vive -, pode chegar a R$ 547 milhões por ano.
Trabalhadores que vivem em cidades nas quais os serviços de saneamento atendem a praticamente toda a população ganham, em média, 13,3% mais do que os que vivem em locais sem coleta de esgoto. Tendo esse diferencial como base e levando em conta a renda média dos brasileiros e o número de trabalhadores que não dispõem de serviços adequados de saneamento básico, a FGV calculou que, se o País alcançasse a universalização desses serviços, a massa salarial, de R$ 1,1 trilhão, poderia aumentar R$ 41,5 bilhões.
Eis aí um programa de renda democrático e apolítico, que não escolhe pessoas ou famílias beneficiadas, pois não exige inscrição prévia em órgãos públicos. Curiosamente, o ganho de renda “é praticamente o custo da universalização do sistema de coleta e tratamento de esgoto no Brasil, estimado em R$ 49,8 bilhões”, observam os autores do estudo.
E o programa teria ainda outros benefícios para as finanças públicas, entre eles a redução dos gastos com internações hospitalares em razão de infecções intestinais causadas por más condições de saneamento. Do ponto de vista social, reduziria em 65% o índice de mortalidade entre os pacientes internados com infecções gastrointestinais, o que significa que 1.277 vidas seriam salvas anualmente.
Para as famílias de baixa renda que hoje vivem em más condições de higiene, a universalização do saneamento básico poderia significar a valorização de até 18% de sua moradia, que é seu principal ativo econômico. Para as regiões com potencial turístico reprimido por falta de saneamento básico, a universalização traria investimentos, empregos e mais renda.
* Análise originalmente publicada no O Estado de S.Paulo.
EcoDebate, 26/07/2010
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César Torres