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segunda-feira, 31 de maio de 2010

Redução da biodiversidade ou das atividades antropogênicas?




A população mundial passou de 1 bilhão de habitantes, por volta de 1800, para 6 bilhões de habitantes, no ano 2000, para quase 7 bilhões, em 2010, e deve chegar a 9 bilhões, em 2050. Em 250 anos terá havido um crescimento de 9 vezes no número de pessoas na Terra. Mas a economia (PIB mundial) deverá apresentar um crescimento superior a 100 vezes, no mesmo período, segundo estimativas do grande pesquisador Angus Maddison. Desta forma, o ser humano – e suas atividades econômicas – ocupou crescentemente todos os espaços do Planeta. Em 2005, a pegada ecológica mundial já tinha superado em 30% a capacidade de autorregeneração da Terra.

Contudo, ao invés de reverter o quadro de pauperização do meio ambiente, a humanidade continua sugando os recursos do Planeta. O recente Relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) alerta para os impactos econômicos da perda da biodiversidade no mundo. Em âmbito global, segundo o relatório, os desmatamentos e a degradação florestal geram um custo anual entre US$ 2 trilhões e US$ 4,5 trilhões (R$ 3,6 trilhões e R$ 8,2 trilhões), além de reduzir a biodiversidade, pois 42% das espécies de anfíbios e 40% das de aves estão com a população em declínio. A população de espécies de vertebrados caiu, em média, 31% globalmente entre 1970 e 2006.

O relatório indica cinco principais pressões sobre a biodiversidade atualmente: a perda e a degradação dos habitats (que são convertidos em plantações, pastagens e para produção de biocombustíveis, etc.), as mudanças climáticas, a poluição, o uso insustentável dos recursos e as espécies invasoras. Em uma amostra de 57 países foram achadas mais de 542 espécies invasoras com algum impacto para a biodiversidade, embora os números possam estar subestimados, por falta de dados confiáveis.

Para lutar contra o fim da vida na Terra e os direitos dos não-humanos, foi definido o dia 22 de maio de 2010, como o Dia Internacional da Biodiversidade no Ano Internacional da Biodiversidade. A Rede Biodiversidade 2010 criou um espaço virtual onde os participantes podem obter informações interessantes sobre biodiversidade, ter acesso a uma agenda de eventos relacionados, postar e ver fotos, e ainda sugerir atividades para celebrar o Dia da Biodiversidade, acessível em: http://diadabiodiversidade.ning.com/

A humanidade vai ter que escolher entre o declínio da biodiversidade ou das atividades antropogênicas que danificam o meio ambiente. Evidentemente, existe a possibilidade de uma biocivilização, construída com base no trinômio: biodiversidade, biomassa e biotecnologia. A região tropical poderá ter um papel central na construção da biocivilização, pois possue a maior diversidade biológica do Planeta. Contudo, caso a humanidade opte pelo declínio da biodiversidade, estará seguindo o caminho inevitável para o suicídio e o ecocídio.

Mas ainda há tempo para salvar a vida, a água, as florestas e respeitar os direitos dos seres vivos “trans-humanos” (superando o antropocentrismo), pois, sem a biodiversidade, não haverá condições de sobrevivência da humanidade, em uma Terra arrasada.

José Eustáquio Diniz Alves, articulista do EcoDebate.
EcoDebate, 21/05/2010

Parar de comer carne pode ajudar a salvar o planeta?


Parar de comer carne pode salvar o planeta? – Os representantes que chegavam aos portões da conferência sobre o clima em Copenhague, no mês passado, eram recebidos por mulheres vestidas como animais peludos segurando placas mostrando imagens de carneiros, vacas e porcos e alertando: “Não me coma”.

As mulheres eram representantes de Ching Hai, a líder de um grupo que defende a adoção de preceitos budistas, incluindo seguir uma dieta vegetariana.

Enquanto faziam fila por horas sob condições congelantes, muitos dos delegados pareciam gratos pelos lanches bem embalados ¬- sanduíches sem carne – que as mulheres distribuíam de graça. Reportagem de James Kanter, International Herald Tribune/The New York Times News Service.

Os seguidores de Ching Hai dizem que uma das metas principais dela é combater desastres ambientais, e seus representantes em Copenhague pareciam ávidos em divulgar a mensagem de que o metano, expelido em grandes quantidades por vacas e outros rebanhos criados pelas indústrias de carne e laticínios, está entre os mais potentes gases do efeito estufa.

Mas as virtudes do vegetarianismo como parte do combate à mudança climática estão longe de ser uma questão apenas para aqueles com inclinação espiritual.

Muito antes do encontro de cúpula em Copenhague, o aumento da demanda por carne e laticínios, particularmente entre a crescente classe média de países como China e Índia, com economias em rápido desenvolvimento, fez com que os elos entre a mudança climática e a política alimentícia se transformassem em um elemento importante no debate em torno do que fazer a respeito do aumento dos níveis dos gases do efeito estufa.

O assunto pareceu ganhar força nas semanas que antecederam a conferência em Copenhague, com figuras proeminentes dos mundos da ciência e do entretenimento entrando na briga.

Falando no Parlamento Europeu no início de dezembro, o ex-Beatle Paul McCartney disse que há uma necessidade urgente de fazer algo a respeito da produção de carne, não apenas por causa de seus efeitos sobre o clima, mas também por causa de questões relacionadas, como desmatamento e segurança das reservas de água.

McCartney, que há muito defende o vegetarianismo, pediu aos legisladores europeus que apoiem políticas que encorajem os cidadãos a evitarem de comer carne pelo menos um dia por semana, algo que poderia virar tão comum como reciclagem ou carros que rodam com tecnologia híbrida.

Funcionários públicos na cidade belga de Ghent e crianças em idade escolar de Baltimore já realizam o dia sem comer carne uma vez por semana, ele disse.

McCartney estava acompanhado no Parlamento por Rajendra Pachauri, o presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática e ganhador do Prêmio Nobel da Paz de 2007, que é a principal entidade da ONU que estuda o clima.

A conscientização pública dos problemas associados à carne é baixa, e as autoridades poderiam considerar impor uma sobretaxa sobre a carne bovina para desencorajar o consumo, disse Pachauri em comentários divulgados pela agência de notícias France-Presse.

Os produtores de carne imediatamente rotularam os comentários como um ataque à indústria e críticas vieram até de lugares tão distantes quanto a Nova Zelândia.

“Cortar a carne por um dia pode parecer uma solução simples, mas há pouca evidência mostrando qualquer benefício”, disse Rod Slater, o presidente-executivo da Beef and Lamb New Zealand, para a associação de imprensa do país.

“Sugerir que a carne não é verde é uma difamação emotiva contra uma indústria que continua investindo em pesquisa, lutando por maiores melhorias”, acrescentou Slater, que disse que as pessoas que vivem na Nova Zelândia obtêm suas necessidades nutricionais diárias e grande parte de suas proteínas, zinco e vitamina B12, da carne bovina e de carneiro.

De fato, como várias outras áreas de pesquisa na ciência climática, a intensidade dos gases do efeito estufa na produção de carne é contestada.

Quando um estudo na edição de novembro-dezembro da revista “World Watch” alegou que mais da metade dos gases produzidos pelo homem e que aquecem o planeta eram causados pela indústria da carne, um grupo de pesquisa do setor rebateu que um estudo da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) já tinha mostrado que o número relevante era mais próximo de 18%.

O estudo publicado na “World Watch” fracassou em “realçar os contrafatuais – como, por exemplo, seria um mundo sem rebanhos domesticados”, escreveu Carlos Sere, diretor-geral do Instituto de Pesquisa Internacional de Rebanhos, em Nairóbi, na “Green Inc.” em novembro.

“Os herbíveros selvagens e cupins não poderiam tomar muitos desses ambientes, produzindo no final tantos gases do efeito estufa quanto os ruminantes domesticados?”, perguntou Sere. “Nós francamente não sabemos ainda.”

Certamente a questão pode ter muito mais nuances do que alguns comentaristas sugerem.

Por exemplo: gado alimentado no pasto pode ter uma pegada de carbono muito menor do que aquele alimentado com ração em confinamento, porque os animais em pastos exigem menos insumos baseados em combustíveis fósseis como fertilizantes e porque eles ajudam o solo a sequestrar carbono.

Esforços renovados estão em andamento para se chegar ao fundo do assunto.

No início deste mês, a Organização Mundial para a Saúde Animal disse que estudaria o efeito da produção de carne sobre a mudança climática, diante dos pedidos de seus países membros.

“É uma questão que precisa ser estudada com bastante isenção”, disse Bernard Vallat, o diretor-geral da organização, em uma coletiva de imprensa segundo a agência de notícias Reuters. “Nós queremos dar uma contribuição modesta e independente”, ele disse.

Vallet disse que uma das questões mais espinhosas é como envolver a agropecuária nos esforços para reduzir os gases, mantendo ao mesmo tempo a segurança alimentar.

Sere, do instituto de pesquisa dos rebanhos, reconheceu a necessidade do desenvolvimento de uma forma de produção de rebanhos entre a pecuária industrial e familiar, que eliminaria a pobreza sem esgotar os recursos naturais ou prejudicar o clima.

Ele disse que os ambientalistas devem ter em mente que “a maior preocupação de muitos especialistas em relação aos rebanhos nos países em desenvolvimento não é seu impacto sobre a mudança climática, mas, sim, o impacto da mudança climática sobre a produção dos rebanhos”.

Os “ambientes tropicais mais quentes e mais extremos que estão sendo previstos não ameaçam apenas até um bilhão de meios de vida baseados na pecuária, mas também o suprimento de leite, carne e ovos para as comunidades famintas que mais necessitam desses alimentos”, ele disse.

Tradução: George El Khouri Andolfato

A crise ambiental e a nossa Casa Comum


A percepção dos brasileiros de que os EUA são o maior culpado pelo aquecimento global – percepção correta, uma vez que é o país que mais contribuiu historicamente para o acúmulo de gases do efeito estufa na atmosfera – leva à essência do problema do aquecimento global: o consumo excessivo. “Vivemos numa cultura da estupidez e da insensatez. Não é estúpido e insano que 500 milhões sejam responsáveis por 50% de todas as emissões de gases de efeito estufa e que 3,4 bilhões respondam apenas por 7% e sendo as principais vitimas inocentes?”, pergunta Leonardo Boff.

A indagação de Boff é pertinente. Na origem da crise ecológica está o consumo desenfreado de um décimo da humanidade. Quando se pensa que uma sociedade sustentável é aquela que satisfaz suas necessidades sem diminuir as perspectivas futuras, percebe-se que o modo de produção e de consumo de parte da humanidade está comprometendo a vida das futuras gerações. É esse egocentrismo que está decidindo a sorte dos que virão depois de nós, deixando-lhes um mundo árido, poluído e feio.

Reduzir a emissão dos gases-estufa exige a redução do consumo. Aqui se situa o maior dilema da humanidade. A ideia e o pensamento do que importa é o crescimento econômico e o restante é secundário não se sustenta mais. Por trás dessa ideia está a lógica de que os recursos naturais são sempre abundantes, infinitos. Não há porque se preocupar com a possibilidade de que algum dia teremos falta de petróleo, de carvão, de aço, de água, de energia… para alimentar a “máquina” do progresso humano. Construiu-se uma crença no crescimento econômico – o capitalismo vive da promessa de que o futuro é sempre promissor e de que o desenvolvimento econômico é inesgotável. Essa lógica econômica vigente nos últimos 200 ou 250 anos, se transformou em uma mentira.

Tome-se como exemplo a questão energética. A civilização moderna é insaciável por energia. A voracidade por energia está associada aos padrões sempre crescentes de produção e consumo. A energia impostou-se no centro do desenvolvimento neste início do século XXI. Não há país no mundo hoje que não esteja às voltas com a questão energética, que tem hoje o potencial de estrangular qualquer economia. O mundo necessita sempre mais de petróleo, carvão, gás, eletricidade, energia nuclear e agora biocombustíveis. O uso sempre ascendente de energia, entretanto, é incompatível com a crise ecológica. Quando mais energia se consome mais pressão se exerce sobre os recursos naturais.

Reduzir emissões, portanto, significa mudar a matriz energética e aí começa um dilema que o planeta precisa enfrentar. Buscar fontes alternativas de energia para evitar as emissões de gases poluentes implica alocar mais trabalho e capital, o que reduziria os lucros do sistema produtivo. “A saída é alterar a estrutura de consumo mundial e os paradigmas de distribuição dos recursos. No momento, não há forças políticas que conjuminem essas necessidades”, afirma o professor Ildo Sauer, do Instituto de Eletrotécnica e Energia (IEE) da USP.

Chegamos ao ponto nevrálgico da crise ecológica. Quem obrigará os mais ricos a consumirem menos? Que deixem de comprar SUVs – carros utilitários esportivos enormes e potentes – poluidores? Que viagem menos? Comprem menos? Comam menos?

Nessa perspectiva, as reflexões de José Eli da Veiga são instigantes. Segundo ele – que acaba de lançar a obra Mundo em Transe – Do Aquecimento Global ao Ecodesenvolvimento – “grandes negociações internacionais sobre a questão climática terão pouco efeito prático se os países continuarem a seguir o modelo de crescimento econômico acelerado como norte de suas políticas”. Afirma Veiga: “Esse é um debate muito difícil, mas que já começa a ganhar espaço em alguns países. Se mesmo nas economias mais ecoeficientes a pressão por recursos naturais aumenta, entre elas a do carbono, isso só pode ser explicado como um efeito do crescimento dessas economias. A questão é que a prosperidade de uma nação não pode ser reduzida à produção ou ao consumo, ou seja, não pode ser entendida simplesmente como sinônimo de crescimento econômico”.

Na prática, isso quer dizer que países que alcançaram elevados padrões de vida e consumo, como os escandinavos, poderiam abrir mão do crescimento econômico em troca de um modelo de desenvolvimento realmente sustentável. Num futuro distante, essas economias poderiam até “encolher”, sem que isso representasse perda dessa condição próspera. “Obviamente, esse é um conceito que ainda levará tempo, que é aplicável hoje apenas para países sem desigualdades. No entanto, vemos um esforço grande de governos nesse sentido, sobretudo os que estão olhando não para os próximos 10 ou 15 anos, mas para daqui 50 ou 60 anos. A busca por novas métricas que substituam o PIB como parâmetro de desenvolvimento econômico, como a do governo francês, é um ótimo exemplo nesse sentido.”

Nesse debate situa-se o Brasil. Em que pese a proposta ousada do Brasil em Copenhague – o país anunciou oficialmente seu compromisso de reduzir voluntariamente entre 36% e 39% de suas emissões até 2020 – e sobre a qual pairam uma série de dúvidas, entre elas, de como irá garantir essa redução, é necessário olhar criticamente o modelo econômico em curso no país que estimula a todo custo o consumo. Sintomático nesse sentido é uma afirmação de Lula nessa semana: “Jamais na minha vida pensei que eu ia para a TV fazer apologia do consumo. Na juventude, eu era contra a sociedade consumista”. Consumo esse que vem exigindo do país esforços gigantescos em investimentos na área de infraestrutura, como por exemplo, na área da energia.

A crise energética está umbilicalmente ligada à crise climática. O modelo energético do país para além do atendimento de energia para a demanda interna se presta, sobretudo a garantia da produção de commodities para exportação (minérios, grãos e combustível) que no exterior sustentam os altos padrões de consumo de parcela pequena da população mundial.

É nesse contexto que dever ser analisadas criticamente os pesados investimentos brasileiro em recursos energéticos ainda tributários da sociedade industrial: hidrelétricas, usinas nucleares, petróleo, agrocombustível. Neste aspecto, o Brasil em vez de assumir a vanguarda no processo de descarbonização da economia, investe em matrizes superadas – grandes hidrelétricas como as do Rio Madeira e de Belo Monte e usinas nucleares. Essas grandes obras implicam em grandes inundações de terras, no caso das hidrelétricas, em significativos deslocamentos de pessoas e em devastação ambiental gigantesca. São matrizes centralizadoras e concentradoras – razão dos sucessivos apagões.

Essa é também a lógica subjacente aos agrocombustíveis que utilizam grandes extensões de terra, produção em larga escala, avançando sobre terras agricultáveis e voltadas para suprir preferencialmente o mercado externo. É nesse mesmo sentido que se deve olhar criticamente o pré-sal. E, ainda pior, via de regra, esses mega-projetos estão antes de tudo a serviço dos interesses do capital.

Como destaca José Eli da Veiga, em recente entrevista ao IHU, o Brasil está perdendo o bonde da história, exatamente por uma visão obtusa de desenvolvimento. Comentando a Conferência de Copenhague, ele afirma: “A importância que eu dou para Copenhague não é tão grande. A transição ao baixo carbono está em curso faz tempo e independe de Copenhagen. Os países que mais rapidamente perceberam que em vez de um problema, uma restrição, isso é uma grande oportunidade para uma nova etapa do capitalismo, já estão há muito tempo investindo em ciência, tecnologia e inovação. Assim, eles possuindo essas tecnologias que poderão ser a solução, terão as oportunidades de negócio. Isso está ocorrendo e vai continuar ocorrendo, seja qual for o resultado de Copenhague. E os países emergentes, como o Brasil, que ficaram nessa linha obtusa de resistência, não investindo em ciência e tecnologia com prioridade, não terão essas tecnologias e continuarão tendo que discutir essa questão de como vão comprar tecnologia dos outros através da tal transferência de tecnologia”.

A grande questão posta hoje é que tipo de crescimento econômico queremos? Por muito tempo, inclusive na esquerda, acreditou-se que o crescimento econômico seria a varinha de condão para a resolução de todos os problemas. Particularmente da pobreza. A equação é conhecida. O crescimento econômico produziria um círculo virtuoso: produção-emprego-consumo. Porém, o axioma de que apenas o crescimento econômico torna possível a justiça social não é verdadeiro. Será que o grande projeto brasileiro é transformar todos cidadãos em consumidores. É preciso complexificar o debate.

O grande desafio é construir uma sociedade que seja sustentável com a natureza, às necessidades humanas presentes e futuras, com uma ética solidária, definidas desde os setores populares, tendo como fim a construção de uma sociedade baseada em valores da solidariedade, liberdade, democracia, justiça e equidade.

Segundo Leonardo Boff, “temos que torcer para que em Copenhague não prevaleça a estupidez mas o cuidado pelo nosso destino comum”. Continua ele: “Todos somos coproprietários da única Casa Comum e somos corresponsáveis pela sua saúde. A Terra pertence a todos. Nós a pedimos emprestado das gerações futuras e nos foi entregue em confiança para que cuidássemos dela. Se olharmos o que estamos fazendo, devemos reconhecer que a estamos traindo. Amamos mais o lucro que a vida, estamos mais empenhados em salvar o sistema econômico-financeiro que a humanidade e a Terra”.

Conjuntura da Semana. Uma leitura das ‘Notícias do Dia’ do IHU de 24 de novembro a 08 de dezembro de 2009

Ecodebate, 14/12/2009

Estímulo ao consumo em tempos de crise ameaça futuro sustentável


Foto: SXC

Recursos da Terra não suportam pressão humana – Pesquisa mostra que se todos os consumidores seguissem padrão norte-americano, seriam necessários 4,5 planetas para atender à demanda.

Se o impacto do ser humano na Terra fosse medido segundo a numeração de roupa, seria possível dizer que a humanidade, de tamanho 54, tenta ocupar um planeta cujo o formato é capaz apenas de suportar o tamanho 34.

“Nós vivemos num planeta em que, em menos de 200 anos, saltamos de 1,5 bilhão de pessoas para 6,5 bilhões. Em 40 anos, deveremos ser 9 bilhões na Terra. Precisamos entender que não estamos enfrentando um problema pequeno, como escassez de petróleo: viveremos o fenômeno de que tudo será escasso.”

A conclusão pouco animadora é de Achim Steiner, diretor do Pnuma, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Em sua atribuição, ele se preocupa com as medidas econômicas adotadas pelas nações industrializadas: o consumo como remédio para combater a recessão.

Sociedade do consumo

A ideia está por toda a parte: quanto mais se compra mais feliz se vive. E também se consolida nos estudos de psicologia.

“Durante séculos, milênios mesmo, tivemos que acumular para sobreviver. Quem acumulava mais tinha melhores chances de resistir ao próximo inverno. Isso, aprendemos ao longo da nossa história. Atualmente, as pessoas continuam seguindo esse padrão de comportamento. Elas creem: preciso ter cada vez mais e mais, porque assim minha sobrevivência e minha felicidade estarão garantidas”, analisa Tal Ben Shahar, que conduziu uma pesquisa sobre o assunto em Harvard.

Tempo de ser sustentável

Há quase 40 anos, o Clube de Roma, uma organização ambientalista que prega uma mudança de pensamento global para diferentes questões políticas, profetizou o fim da sociedade consumista no relatório Fronteiras do crescimento. Aparentemente, o prognóstico não se consolidou, tendo em vista a geração que vem por aí.

Charles Hopkins, membro da UNESCO e professor da Universidade York, em Toronto, ressalta que as gerações futuras terão que encontrar soluções para questões ligadas à agricultura, escassez de água e diminuição do estoque de peixes.

O pesquisador acrescenta: “E não podemos esquecer que as próximas gerações terão que triplicar o abastecimento de energia. E o mais complicado: a produção de energia precisa ser livre de emissões de carbono. Ainda não temos solução para o problema atualmente, mas já sabemos que o sistema energético no futuro precisa ser neutro em CO2″.

Em sua pesquisa intitulada Transformação da cultura: Do consumo à sustentabilidade, Hopkins calcula qual padrão de vida manteria o planeta estável. Se todos os 6,5 bilhões de habitantes vivessem segundo os padrões norte-americanos de consumo, seriam necessários 4,5 planetas Terra para atender à demanda. Se o fosse adotado o exemplo europeu, três planetas dariam conta da sede dos consumidores. E mesmo o nível de vida da Tailândia ou da Jordânia excederia a capacidade sustentável.

Mudança ou futuro sombrio

“O princípio básico: precisamos de mais eficiência e menos lixo. A natureza não sabe o que é lixo. O que para um organismo é descartado como resíduo, para outro pode ser fonte de alimento”, ressalta Achim Steiner. O pesquisador lembra a importância da adoção de um sistema semelhante na sociedade moderna. “Temos apenas que fazê-lo de uma maneira economicamente plausível.”

Esse seria o fim da sociedade do descartável. E, como espera Charles Hopkins, haveria uma renascença do modelo de economia verde. “A solução não está apenas em aumentar a eficiência. Como efeito final, Isso significaria apenas mais produção de mercadoria mais barata e, com isso, extinguir ainda mais rápido as fontes não-renováveis. Se não mudarmos o modo de pensar de forma radical, podemos nos conduzir ao abismo”, teoriza Hopkins.

A conclusão de Steiner não é diferente. “Uma coisa nós já sabemos com certeza: não poderemos viver pacificamente neste planeta se continuarmos, no século 21, seguindo o modelo econômico do século 20.”

Autor: M. Amberger / H. Jeppesen / N. Pontes
Revisão: Augusto Valente

Reportagem da Agência Deutsche Welle, DW-WORLD.DE, publicada pelo EcoDebate, 01/03/2010

Foto: SXC

Recursos da Terra não suportam pressão humana – Pesquisa mostra que se todos os consumidores seguissem padrão norte-americano, seriam necessários 4,5 planetas para atender à demanda.

Se o impacto do ser humano na Terra fosse medido segundo a numeração de roupa, seria possível dizer que a humanidade, de tamanho 54, tenta ocupar um planeta cujo o formato é capaz apenas de suportar o tamanho 34.

“Nós vivemos num planeta em que, em menos de 200 anos, saltamos de 1,5 bilhão de pessoas para 6,5 bilhões. Em 40 anos, deveremos ser 9 bilhões na Terra. Precisamos entender que não estamos enfrentando um problema pequeno, como escassez de petróleo: viveremos o fenômeno de que tudo será escasso.”

A conclusão pouco animadora é de Achim Steiner, diretor do Pnuma, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Em sua atribuição, ele se preocupa com as medidas econômicas adotadas pelas nações industrializadas: o consumo como remédio para combater a recessão.

Sociedade do consumo

A ideia está por toda a parte: quanto mais se compra mais feliz se vive. E também se consolida nos estudos de psicologia.

“Durante séculos, milênios mesmo, tivemos que acumular para sobreviver. Quem acumulava mais tinha melhores chances de resistir ao próximo inverno. Isso, aprendemos ao longo da nossa história. Atualmente, as pessoas continuam seguindo esse padrão de comportamento. Elas creem: preciso ter cada vez mais e mais, porque assim minha sobrevivência e minha felicidade estarão garantidas”, analisa Tal Ben Shahar, que conduziu uma pesquisa sobre o assunto em Harvard.

Tempo de ser sustentável

Há quase 40 anos, o Clube de Roma, uma organização ambientalista que prega uma mudança de pensamento global para diferentes questões políticas, profetizou o fim da sociedade consumista no relatório Fronteiras do crescimento. Aparentemente, o prognóstico não se consolidou, tendo em vista a geração que vem por aí.

Charles Hopkins, membro da UNESCO e professor da Universidade York, em Toronto, ressalta que as gerações futuras terão que encontrar soluções para questões ligadas à agricultura, escassez de água e diminuição do estoque de peixes.

O pesquisador acrescenta: “E não podemos esquecer que as próximas gerações terão que triplicar o abastecimento de energia. E o mais complicado: a produção de energia precisa ser livre de emissões de carbono. Ainda não temos solução para o problema atualmente, mas já sabemos que o sistema energético no futuro precisa ser neutro em CO2″.

Em sua pesquisa intitulada Transformação da cultura: Do consumo à sustentabilidade, Hopkins calcula qual padrão de vida manteria o planeta estável. Se todos os 6,5 bilhões de habitantes vivessem segundo os padrões norte-americanos de consumo, seriam necessários 4,5 planetas Terra para atender à demanda. Se o fosse adotado o exemplo europeu, três planetas dariam conta da sede dos consumidores. E mesmo o nível de vida da Tailândia ou da Jordânia excederia a capacidade sustentável.

Mudança ou futuro sombrio

“O princípio básico: precisamos de mais eficiência e menos lixo. A natureza não sabe o que é lixo. O que para um organismo é descartado como resíduo, para outro pode ser fonte de alimento”, ressalta Achim Steiner. O pesquisador lembra a importância da adoção de um sistema semelhante na sociedade moderna. “Temos apenas que fazê-lo de uma maneira economicamente plausível.”

Esse seria o fim da sociedade do descartável. E, como espera Charles Hopkins, haveria uma renascença do modelo de economia verde. “A solução não está apenas em aumentar a eficiência. Como efeito final, Isso significaria apenas mais produção de mercadoria mais barata e, com isso, extinguir ainda mais rápido as fontes não-renováveis. Se não mudarmos o modo de pensar de forma radical, podemos nos conduzir ao abismo”, teoriza Hopkins.

A conclusão de Steiner não é diferente. “Uma coisa nós já sabemos com certeza: não poderemos viver pacificamente neste planeta se continuarmos, no século 21, seguindo o modelo econômico do século 20.”

Autor: M. Amberger / H. Jeppesen / N. Pontes
Revisão: Augusto Valente

Reportagem da Agência Deutsche Welle, DW-WORLD.DE, publicada pelo EcoDebate, 01/03/2010

Resíduo eletrônico: O que fazer?




Seu computador estraga ou você decide comprar um novo celular. O que você faz com o equipamento antigo? Segundo o professor de Engenharia de Materiais da UFGRS, Hugo Veit, os brasileiros produzem cerca de 300 mil toneladas de resíduo eletrônico anualmente. Infelizmente, o país ainda não tem locais apropriados para descarte desses equipamentos.

Em entrevista, por telefone, à IHU On-Line, Veit alerta para os riscos ambientais que os resíduos eletrônicos podem trazer. “A composição química desses resíduos é muito variada. Se esses metais forem descartados de forma incorreta na natureza, eles vão contaminar o solo, o lençol freático, a água, e, de uma forma ou de outra, isso volta para nós”, destaca. Para o professor, uma das formas para evitar a grande produção deste tipo de lixo é frear o consumismo, uma tarefa nada fácil. “É difícil desmaterializarmos. Temos a vontade de sempre acompanhar a tecnologia, com equipamentos mais novos”, defende.

Hugo Veit possui graduação em Engenharia Metalúrgica, mestrado e doutorado em Engenharia de Minas, Metalúrgica e de Materiais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente, é professor da Escola de Engenharia/Departamento de Materiais e pesquisador do Laboratório de Corrosão, Proteção e Reciclagem de Materiais (LACOR).

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O que pode ser considerado resíduo eletrônico?

Hugo Veit – Todo o tipo de equipamento como mp3, mp4, computador e celular. Esses aparelhos são considerados eletro-eletrônicos, assim como suas pilhas e baterias. Tudo isso é lixo eletro-eletrônico. O que acontece hoje é que a linha branca, que contempla geladeiras, fogões, máquinas de lavar roupas etc., que antigamente não se enquadravam como lixo eletrônico, começa a fazer parte deste grupo, já que têm em seu sistema cada vez mais eletrônicos embarcados.
IHU On-Line – Onde vão parar os resíduos eletrônicos e qual é o lugar certo?

Hugo Veit – Existem vários destinos para esse lixo. No campo doméstico, não há onde depositá-los, então, muita gente ainda descarta celulares, televisores e computadores velhos junto ao lixo seco. Atualmente, as grandes empresas ou órgãos públicos fazem parcerias, principalmente com ONGs, para remanufatura ou reciclagem. Eles recebem equipamentos defeituosos ou obsoletos, como processadores, por exemplo, e utilizam as peças para remontar produtos que estejam em condição de uso.

Depois, esses aparelhos geralmente são doados para centros de inclusão digital. Os consumidores domésticos que possuem lixo eletrônico em casa devem levá-lo a esses órgãos sociais, não existe alternativa. Não existem pontos de coleta para esse tipo de resíduo, com exceção de pilhas e baterias. Como o volume é menor, encontramos depósitos para esse tipo de produto em bancos e universidades, por exemplo. As operadoras de celulares também disponibilizam urnas de coleta para celulares obsoletos. O ideal seria levar esse material para indústrias de reciclagem, mas como elas não existem de forma esquematizada no Brasil, o essencial é não misturar o lixo eletrônico com o lixo orgânico ou seco. Caso não haja uma urna de coleta próxima, é interessante procurar entidades sociais que aceitam doações de equipamentos estragados.

IHU On-Line – Que tipo de problemas ambientais os resíduos eletrônicos podem trazer?

Hugo Veit – Vários tipos, pois a composição química desses resíduos é muito variada. Em sua fabricação, são utilizados muitos tipos de metais, e alguns deles são tóxicos. Há chumbo, mercúrio e cádmio, por exemplo. Se esses metais forem descartados de forma incorreta na natureza, eles vão contaminar o solo, o lençol freático, a água, e, de uma forma ou de outra, isso volta para nós. Há outros tipos de compostos químicos que se misturam ao plástico da carcaça do aparelho, que são à base de bromo. Esses compostos são utilizados como retardadores de chama. É uma questão de segurança, mas, no momento da reciclagem, esses compostos, em contato com a natureza, serão prejudiciais à saúde humana. Eles atacam o sistema nervoso, endócrino e respiratório.

IHU On-Line – Qual é o volume brasileiro de lixo eletrônico?

Hugo Veit – Não temos uma estatística muito confiável de quanto resíduo é gerado. O que se tem são dados de vendas de equipamentos. No ano passado, foram vendidos cerca de 40 milhões de celulares e 12 milhões de computadores no Brasil. Cada aparelho tem uma vida útil específica, no caso do celular, é de mais ou menos um ano e meio. No final desse tempo, milhões de aparelhos vão para o lixo. No caso dos computadores, a vida útil é de cerca de três anos.

“Se somarmos todos os produtos, produzimos cerca de 300 mil toneladas por ano de resíduo eletrônico”

A estatística em torno da quantidade de resíduos ainda é insuficiente. O que se tem é um relatório da ONU. No ano passado, foi publicado um relatório com dados de 2005. No trabalho de pesquisa da organização, chegou-se a valores de meio quilo de resíduos de computador por habitante, anualmente, no Brasil. Se pensarmos nisso, levando em conta que temos cerca de 190 milhões de habitantes, teremos 95 milhões de quilos de resíduos só de computadores. No caso dos televisores, são 0,6 quilos por habitantes. Se somarmos todos os produtos, produzimos cerca de 300 mil toneladas por ano de resíduo eletrônico.

IHU On-Line – O senhor pode nos explicar quais são as rotas que podem ser usadas para reciclagem?

Hugo Veit – Há dois tipos de reciclagem: a de metal e a de plásticos. Na parte de metais, temos,basicamente, quatro rotas possíveis, todas baseadas em processos metalúrgicos, de fabricação de metais a partir da natureza. Existe a pirometalurgia, cuja ideia é baseada em processos térmicos com a fundição do resíduo. Quando imaginamos um resíduo eletrônico dentro de um forno, por exemplo, a ideia é queimá-lo. A parte plástica irá evaporar e a parte metálica vai virar uma liga metálica. É a partir dessa liga que se separa o cobre do ferro, do alumínio etc. O problema dessa rota é que, como estamos queimando o lixo, e a parte plástica é tóxica, devemos ter um bom sistema de escapamento. Porém, processos térmicos têm um grande consumo energético, já que exigem altas temperaturas.

Outra rota é a hidrometalurgia. A ideia é lavar o resíduo para dissolver a parte metálica e levar os metais para uma solução iônica. Assim, podemos separá-los entre si.

A terceira rota é o processamento mecânico, onde se utiliza a diferença de propriedades físicas. Sabemos que alguns metais são mais pesados, magnéticos ou condutores.

A quarta rota para reciclar metais é eletrometalurgia, que, ao invés de conservar os metais na forma sólida, os dissolvem em uma solução iônica, onde podemos reduzi-los a uma célula para que os metais possam ser separados.

Na parte dos plásticos, temos algumas alternativas com três rotas principais: a reciclagem mecânica, química e energética. A reciclagem energética é baseada na ideia de que o plástico é originado do petróleo, e que, em princípio, ele é um combustível que pode ser queimado para a geração de energia. Claro que não é uma queima a céu aberto, é uma queima controlada.

A reciclagem química tem a ideia de pegar o plástico dos equipamentos e transformá-los novamente em um produto petroquímico, como se estivéssemos partindo do petróleo e usando-o para fazer plástico.

Por fim, a reciclagem mecânica é a mais utilizada. Consiste em quebrar o plástico, pegar um tipo de polímero, cuidando para separar os plásticos por tipos, triturá-lo, e, com esse material moído, fazer uma peça plástica. Isso pode ser feito com 100% de material reciclado ou com um percentual de material novo.

IHU On-Line – O setor informal pode reciclar também esses resíduos?

Hugo Veit – Isso é muito complicado. A grande dificuldade da reciclagem de eletro-eletrônicos é a complexidade. Não é uma reciclagem simples e manual. Associações de catadores, por exemplo, não terão equipamentos mais sofisticados para separar esses materiais. É diferente de pegar lixo seco e fazer a separação dos componentes. A reciclagem de eletrônicos envolve processos industriais mais elaborados, com várias etapas.

IHU On-Line – De que forma a sociedade mundial precisa avançar para a desmaterialização?

Hugo Veit – É difícil desmaterializarmos. Temos a vontade de sempre acompanhar a tecnologia, com equipamentos mais novos, mais modernos, com mais recursos. Isso se dá também pela vida útil muito curta dos aparelhos. Porém, muitas vezes, trocamos de celular, por exemplo, não porque ele estragou, mas porque queremos um novo. Esta é uma questão de educação ambiental.

“Muitas vezes, trocamos de celular, por exemplo, não porque ele estragou, mas porque queremos um novo”

A educação de casa, do colégio, deve fazer com que o consumismo não seja tão importante em nossas vidas. O Brasil, principalmente, tem muito que evoluir. Existem outros países onde o consumismo não é tão grande, e mesmo que seja, alguns possuem uma boa educação ambiental e conseguem separar bem o lixo. Quanto mais segregado for o resíduo que geramos, mais viável será o processo de reciclagem. No Brasil, falta muito para uma evolução. Não temos legislação para o lixo eletrônico, então de quem é a responsabilidade? Não existe uma corresponsabilidade. Temos muito que crescer em termos de reciclagem, coleta, educação e conscientização no Brasil.

(Ecodebate, 21/05/2010) publicado pelo IHU On-line

Exposição a produtos químicos comuns pode afetar o desenvolvimento feminino


Fonte “Interferentes endócrinos no ambiente“, de Gislaine Ghiselli e Wilson F. Jardim
Os pesquisadores do Mount Sinai School of Medicine descobriram que a exposição a três classes de produtos químicos comuns (fenóis, ftalatos e fitoestrogênios) em jovens pode comprometer o sincronismo do desenvolvimento puberal, e colocar as meninas em situação de risco para complicações de saúde quando adultas.

O estudo [Investigation of Relationships between Urinary Biomarkers of Phytoestrogens, Phthalates, and Phenols and Pubertal Stages in Girls] , o primeiro para examinar os efeitos dessas substâncias sobre o desenvolvimento puberal, foi publicada na edição online da revista Environmental Health Perspectives.

“A pesquisa mostrou que o desenvolvimento puberal precoce em meninas pode ter efeitos sociais e médicos adversos, incluindo câncer e diabetes quando da idade adulta”, disse Maria Wolff, professor de Medicina Preventiva e Ciências Oncológicas na Mount Sinai School of Medicine.

“Nossa pesquisa mostra uma ligação entre os produtos químicos que as meninas são expostas em uma base diária e o desenvolvimento precoce e, em outros casos, ao desenvolvimento tardio. Embora mais pesquisas sejam necessárias, esses dados são um primeiro passo importante para avaliar o impacto destes agentes ambientais comuns como fatores de risco para meninas”.

Fenóis, ftalatos e fitoestrógenos estão entre os produtos químicos conhecidos como desreguladores endócrinos, que interferem com o sistema endócrino do corpo. Eles são encontrados em uma ampla gama de produtos de consumo, tais como esmaltes, cosméticos, perfumes, loções e shampoos. Alguns são usados para aumentar a flexibilidade e durabilidade de materiais plásticos como PVC, ou são incluídos como revestimentos de medicamentos ou suplementos nutricionais.

Os pesquisadores estudaram meninas do bairro de East Harlem. Trabalhando em conjunto com o Cincinnati Children’s Hospital and Kaiser Permanente Northern California, analisaram o impacto da exposição a agentes ambientais em 1.151 jovens de Nova York, Cincinnati e norte da Califórnia.

As meninas tinham entre 6 – e 8 anos de idade no momento da inscrição e entre 7 e 9 anos de idade quando da análise de dados. Os pesquisadores coletaram amostras de urina dos participantes do estudo para análise de presença para os fenóis, os ftalatos, e fitoestrogênios, incluindo 19 biomarcadores.

Os dados mostraram que as três classes de compostos químicos foram amplamente detectadas na população estudada e que a alta exposição a determinadas substâncias químicas foi associada ao desenvolvimento de mama em estágio inicial.

As ligações mais fortes foram observadas com ftalatos e fitoestrogênios, que também estavam entre os mais altos riscos. Um fenol, dois fitoestrogênios, e um subconjunto de ftalatos (encontrados em produtos de construção e tubos de plástico) foram associados com puberdade tardia. No entanto, os ftalatos encontrados em produtos de uso pessoal, como shampoo e loção, especialmente aqueles com fragrância, foram relacionados ao desenvolvimento precoce de mama e de desenvolvimento dos pelos pubianos.

Consistente com estudos anteriores, os pesquisadores também descobriram que o índice de massa corporal (IMC) desempenhou um papel em relação ao início da puberdade. Cerca de um terço das meninas estavam acima do peso, que é também um indicador de desenvolvimento da mama adiantado. Como resultado, algumas das associações químicas diferentes podem ter maior ou menor impacto em meninas obesas.

Os pesquisadores continuam a estudar o impacto da dieta no desenvolvimento puberal e eventual risco de câncer da mama.

“A exposição a estas substâncias é extremamente comum”, continuou o Dr. Wolff. “Como tal, enquanto a associação entre os produtos químicos e desenvolvimento puberal parece pequena, o impacto sobre a população total é significativa.”

O artigo “ Investigation of Relationships between Urinary Biomarkers of Phytoestrogens, Phthalates, and Phenols and Pubertal Stages in Girls” foi publicado na edição online da revista Environmental Health Perspectives como open access. Para acessar o artigo na íntegra, no formato PDF, clique aqui.

Por Henrique Cortez, do Ecodebate, 26/04/2010, com informações do The Mount Sinai Hospital / Mount Sinai School of Medicine

Inclusão na lista de distribuição do Boletim Diário do Portal EcoDebate

Campeão mundial de uso de agrotóxicos, Brasil se torna o principal destino de produtos banidos no exterior


Foto: iStockphoto

Campeão mundial de uso de agrotóxicos, o Brasil se tornou nos últimos anos o principal destino de produtos banidos em outros países. Nas lavouras brasileiras são usados pelo menos dez produtos proscritos na União Europeia (UE), Estados Unidos e um deles até no Paraguai.

A informação é da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), com base em dados das Nações Unidas (ONU) e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.

Apesar de prevista na legislação, o governo não leva adiante com rapidez a reavaliação desses produtos, etapa indispensável para restringir o uso ou retirá-los do mercado. Desde que, em 2000, foi criado na Anvisa o sistema de avaliação, quatro substâncias foram banidas. Em 2008, nova lista de reavaliação foi feita, mas, por divergências no governo, pressões políticas e ações na Justiça, pouco se avançou. Reportagem de Lígia Formenti, no O Estado de S.Paulo.


Até agora, dos 14 produtos que deveriam ser submetidos à avaliação, só houve uma decisão: a cihexatina, empregada na citrocultura, será banida a partir de 2011. Até lá, seu uso é permitido só no Estado de São Paulo.

Da lista de 2008, três produtos aguardam análise de comissão tripartite – formada pelo Istituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), Ministério da Agricultura (Mapa) e Anvisa – para serem proibidos: acefato, metamidofós e endossulfam. Um item, o triclorfom, teve o pedido de cancelamento feito pelo produtor. Outro produto, o fosmete, terá o registro mantido, mas mediante restrições e cuidados adicionais.

Enquanto as decisões são proteladas, o uso de agrotóxicos sob suspeita de afetar a saúde aumenta. Um exemplo é o endossulfam, associado a problemas endócrinos. Dados da Secretaria de Comércio Exterior mostram que o País importou 1,84 mil tonelada do produto em 2008. Ano passado, saltou para 2,37 mil t.

“Estamos consumindo o lixo que outras nações rejeitam”, resume a coordenadora do Sistema Nacional de Informação Tóxico-Farmacológicas da Fundação Oswaldo Cruz, Rosany Bochner. Proibido na UE, China, Índia e no Paraguai, o metamidofós segue caminho semelhante.

O pesquisador da Fiocruz Marcelo Firpo lembra que esse padrão não é inédito. “Assistimos a fenômeno semelhante com o amianto. Com a redução do mercado internacional, os produtores aumentaram a pressão para aumentar as vendas no Brasil.” As táticas usadas são várias. “Pagamos por isso um preço invisível, que é o aumento do custo na área de saúde”, completa.

O coordenador-geral de Agrotóxicos e Afins do Mapa, Luís Rangel, admite que produtos banidos em outros países e candidatos à revisão no Brasil têm aumento anormal de consumo entre produtores daqui. Para tentar contê-lo, deve ser editada uma instrução normativa fixando teto para importação de agrotóxicos sob suspeita. O limite seria criado segundo a média de consumo dos últimos anos. Exceções seriam analisadas caso a caso.

A lentidão na apreciação da lista começou com ações na Justiça, movidas pelas empresas de agrotóxicos e pelo sindicato das indústrias. Em uma delas, foram incluídos documentos em que o próprio Mapa posicionou-se contrariamente à restrição. Só depois que liminares foram suspensas, em 2009, as análises continuaram.

Empresas. Representantes das indústrias criticam o formato da reavaliação. O setor diz não haver critérios para a escolha dos produtos incluídos na lista. E criticam a Anvisa por falta de transparência. Para as indústrias, o material da Anvisa não traz informações técnicas.

A Associação Nacional de Defesa Vegetal critica as listas de riscos ligados ao uso de produtos, muitas vezes baseadas em estudos feitos em laboratório. “Não há como fazer estudos de risco em população expressiva. A cada dia, mais países baseiam suas decisões em estudos feitos em laboratórios”, rebate o gerente-geral de Toxicologia da Anvisa, Luiz Cláudio Meireles.

EcoDebate, 31/05/2010

Os danos dos agrotóxicos no Sistema Nervoso Central.


Imagem: UC Regents / UCLA
Entrevista com Neice Muller Xavier Faria
Agrotóxicos podem aflorar problemas de saúde que permanecem mesmo depois que não se tenha mais ação direta das substâncias químicas, adverte Neice Muller Xavier Faria

“O principal mecanismo de ação dos inseticidas é sobre o sistema nervoso dos insetos e o problema é que este efeito não se restringe à espécie-alvo e pode afetar também os mamíferos”, adverte a médica e professora da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) Neice Muller Xavier Faria. Na entrevista que segue, concedida por e-mail à IHU On-Line, a pesquisadora relata como os agrotóxicos podem atingir o Sistema Nervoso Central dos seres humanos. Quando contaminados por organofosforados – substâncias químicas que contêm carbono e fósforo, utilizados como inseticidas – e carbamatos – princípios ativos de alguns inseticidas comerciais -, as pessoas podem desenvolver neuropatias, ou seja, afecções que acometem os nervos periféricos que se estendem da medula ou do tronco encefálico até as extremidades. Além disso, destaca, essas substâncias também “podem afetar canais de cálcio ou bloquear o ácido gama-amino-butírico (gaba) como pode ocorrer com o fipronil e avermectinas”. Entre os sintomas mais comuns, a médica destaca ainda casos de “intoxicação aguda onde podem ocorrer, entre outros efeitos, fasciculações, tremores, convulsões, tonteiras, cefaléias e, nos casos graves, perda de consciência/coma”.

Neice Muller Xavier Faria possui graduação em Medicina, pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e mestrado e doutorado em Epidemiologia, pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), com a tese Saúde do trabalhador Rural. Atualmente, é docente da Faculdade Cenecista de Bento Gonçalves, professora convidada dos cursos de pós-graduação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e no Centro de Ensino Superior Cenecista de Farroupilha.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Em que sentido a prática de suicídios em algumas regiões do Rio Grande do Sul está relacionada com os agrotóxicos? Que sintomas essas substâncias causam para levar uma pessoa a cometer suicídio?

Neice Muller Xavier Faria – Em alguns casos, a pessoa ingere agrotóxicos, que neste caso seria o agente causador direto. Sobre a relação entre exposição aos agrotóxicos e a ocorrência de suicídios, conduzi, com outros colegas, um estudo epidemiológico, de delineamento ecológico, que pretendia examinar esta associação. Os coeficientes padronizados de mortalidade por suicídio eram quase três vezes maiores entre trabalhadores da agropecuária/pesca do que em outros grupos como técnicos e administrativos. O estudo tentou identificar exatamente a razão deste aumento na mortalidade por suicídio, principalmente porque o número de trabalhadores rurais é bem maior que o de pescadores. Mas os dados de uso de agrotóxicos (especificamente o receituário agronômico) apresentavam tantos problemas que não foi possível testar esta associação. Por outro lado, num estudo transversal feito entre cerca de 1282 trabalhadores da serra gaúcha (minha dissertação de mestrado), encontramos uma clara associação entre intoxicação por agrotóxicos e a prevalência de transtornos psiquiátricos menores (teste srq-20 ). Além disso, testando isoladamente as questões do srq encontramos associação entre intoxicação por agrotóxicos com 13 dentre os 20 sintomas psiquiátricos avaliados. E, dentre estes, uma clara associação com pensamentos suicidas. Resultados semelhantes foram encontrados por pesquisadores de outros países usando instrumentos diferentes para avaliar depressão/distúrbios psiquiátricos

IHU On-Line – Em que sentido os agrotóxicos também atingem o Sistema Nervoso Central?

Neice Muller Xavier Faria – O principal mecanismo de ação dos inseticidas é sobre o sistema nervoso dos insetos e o problema é que este efeito não se restringe à espécie-alvo e pode afetar também os mamíferos. O mecanismo varia conforme o produto. O mais conhecido é a inibição da acetilcolinesterase (ocorre com os organofosforados e carbamatos ). No caso dos organoforados, pode ocorrer neuropatias de médio e longo prazo. Mas alguns também podem afetar canais de cálcio ou bloquear o ácido gama-aminobutírico (gaba) como pode ocorrer com o fipronil e avermectinas. O efeito neurotóxico mais comum é na intoxicação aguda onde podem ocorrer, entre outros efeitos, fasciculações, tremores, convulsões, tonteiras, cefaléias e, nos casos graves, perda de consciência/coma.

IHU On-Line – Que doenças degenerativas a senhora aponta?

Neice Muller Xavier Faria – Depende do grupo químico e do organismo do trabalhador exposto (outras doenças concomitantes, pré-disposição genética) e do grau de exposição (que inclui vários aspectos das condições de trabalho). Além das neuropatias, podemos encontrar distúrbios respiratórios (asma e doença respiratória crônica inespecífica), gastrointestinais (incluindo hepatopatias) e endócrinos (hipotireoidismo/bócio), além de câncer. Varia conforme o produto envolvido.

IHU On-Line – Como e por quanto tempo essas substâncias costumam agir no corpo humano?

Neice Muller Xavier Faria – Esta resposta não é absoluta. Depende do tipo químico. Os inseticidas organoclorados se fixam na gordura corporal e podem ficar décadas no corpo (bem como no solo). Outros produtos apresentam a meia vida curta como os carbamatos. A questão que se discute hoje é que alguns produtos podem fazer aflorar problemas de saúde que podem permanecer mesmo depois que não tenha mais ação direta dos agrotóxicos. Os problemas psiquiátricos e respiratórios, por exemplo, foram associados à ocorrência de intoxicações no passado.

IHU On-Line – Pesquisas internacionais associam a doença de Parkinson à exposição excessiva de substâncias tóxicas como agrotóxicos. A senhora tem informações sobre isso? Pode nos falar um pouco sobre essa perspectiva?

Neice Muller Xavier Faria – Recentemente, eu estive num congresso internacional de saúde ocupacional, onde assisti uma apresentação de um pesquisador italiano que fez uma revisão de estudos envolvendo neurotoxicidade de agrotóxicos. Ele disse que, embora o tema seja controverso, várias evidências sugerem que existe esta associação. Mencionou especificamente a relação com os organofosforados. Mas tem uma tese brasileira, em São Paulo, que abordou parkinsonismo em relação ao manganês presente em fungicidas ditiocarbamatos.

(Ecodebate, 13/06/2009) publicado pelo IHU On-line, 10/06/2009 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

Glifosato: ‘todo veneno deveria ser proibido’.


Um dos herbicidas que mais tem causado danos ao meio ambiente e também para o ser humano é o glifosato. Ele é uma molécula química sintetizada, desenvolvido para matar qualquer tipo de planta, principalmente perenes. É o ingrediente principal do Roundup, herbicida da Monsanto. Assim, muitas plantas culturais geneticamente modificadas são simplesmente alterações genéticas para resistir ao glifosato. “Em relação à saúde humana, ele mimetiza certos hormônios. Por exemplo, ele pode entrar no cordão umbilical durante a gestação e afetar o desenvolvimento do bebê. Além disso, ele é considerado um desruptor endócrino, ou seja, ele vai acionar genes errados, no momento errado, no órgão errado. Então, ele altera a situação de controle dos genes”, relatou o agrônomo Rubens Nodari durante a entrevista que concedeu à IHU On-Line, por telefone.

Nodari explicou o que é o glifosato e como ele age para que possa matar, de forma não seletiva, as plantas, o uso e o efeito desse herbicida, e, ainda, contou como esse veneno age quando os humanos e outros seres vivos entram em contato com ele. “Alguns organismos não são afetados pelo glifosato. Se se aplica muito glifosato, por exemplo, na água, alguns organismos vão ser beneficiados, e outros não, pois ele não se degrada tão rapidamente. Assim, se altera por completo a diversidade biológica que existe nesse ambiente”, afirmou.

Rubens Onofre Nodari é graduado em agronomia pela Universidade de Passo Fundo e mestre em Fitotecnia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Realizou o doutorado na University Of California At Davis. Atualmente, é professor na Universidade Federal de Santa Catarina.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O que é o glifosato?

Rubens Nodari – O glifosato é uma molécula química que foi sintetizada e que tem a capacidade de produzir um caminho alternativo para as plantas que recebem esse produto. E esse caminho alternativo acaba sufocando a planta quando ocorre, portanto, a interrupção da produção de três aminoácidos. Com isso, as proteínas que são formadas são defeituosas, e as plantas acabam morrendo porque não conseguem sintetizar as proteínas adequadas.

IHU On-Line – Qual o uso que é dado a este químico?

Rubens Nodari – O destino do glifosato é para matar plantas que não são desejáveis num certo espaço.

IHU On-Line – Qual é a composição do Roundup e por que ele é considerado um dos agrotóxicos mais prejudiciais?

Rubens Nodari – O glifosato é uma molécula que causa diferentes tipos de problemas para a saúde humana e também para o meio ambiente. Em relação à saúde humana, ele mimetiza certos hormônios. Por exemplo, ele pode entrar no cordão umbilical durante a gestação e afetar o desenvolvimento do bebê. Além disso, ele é considerado um desruptor endócrino, ou seja, ele vai acionar genes errados, no momento errado, no órgão errado. Então, ele altera a situação de controle dos genes. O glifosato também causa, por exemplo, diminuição da produção de espermas, conforme vimos em experimentos feitos em ratos, ou produz espermas anormais. No caso do sistema endócrino, ele pode, por exemplo, inibir algumas enzimas. Ele vai alterar os hormônios que entram na regulação da expressão gênica.

Geralmente, ele atua na regulação de genes e na expressão de certas substâncias. Existem relatos bastante significativos de ocorrências que associam o câncer a pessoas que aplicam o glifosato. Um agricultor, por exemplo, não aparenta de imediato que vai adoecer, ter um câncer, pois o glifosato age dessa forma com exposições repetidas.

A maioria dos agrotóxicos vai envenenando aos poucos as pessoas e o meio ambiente. Às vezes, não são coisas perceptíveis. Obviamente, quando alguém é submetido a uma grande exposição ao glifosato, sente em seguida irritação nos olhos, na pele, algum sintoma no estômago. Quando as doses são pequenas, é impossível perceber que se está sendo intoxicado aos poucos.

No meio ambiente, ele é considerado mortal a alguns anfíbios e répteis. Ele também favorece algumas bactérias de solo e prejudica a outras. Ele altera a dinâmica da vida, da biota do solo.

IHU On-Line – É bastante difundido, especialmente pela indústria, que o glifosato é menos prejudicial que outros herbicidas. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) o classifica como Classe IV (faixa verde). Como o senhor vê essa questão?

Rubens Nodari – Na verdade, a classificação da Anvisa é muito antiga, e, à luz dos novos resultados, o entendimento que existe é diferente. Hoje, se fosse feita a reavaliação dos resultados do glifosato com os dados que foram obtidos a partir de 2005, talvez a Anvisa mudasse de classificação toxicológica.

IHU On-Line – Como o senhor analisa a pesquisa feita na Argentina que envolve o glifosato?

Rubens Nodari – A Argentina tem feito alguns estudos, inclusive associando o glifosato a consequências nos anfíbios, sobre o uso desse agrotóxico. Há um estudo no qual se percebeu que o glifosato inibe o desenvolvimento de embriões. O glifosato e outros produtos acabam afetando alguns sistemas do corpo humano, principalmente o cérebro, que deixam as pessoas com maior ansiedade. E é isso que faz com que as pessoas tomem decisões consideradas insensatas. Assim, o que se especula, por enquanto, é que as pessoas têm sua capacidade física limitada.

IHU On-Line – Quando o glifosato contamina o solo ou um rio, o que acontece?

Rubens Nodari – Alguns organismos não são afetados pelo glifosato. Se se aplica muito glifosato, por exemplo, na água, alguns organismos vão ser beneficiados, e outros não, pois ele não se degrada tão rapidamente. Assim, se altera por completo a diversidade biológica que existe nesse ambiente. Em relação à água, há menos estudos, mas, de qualquer maneira, já existem relatos de mortalidade de certos organismos que ali vivem. Quando a fonte de glifosato é aplicada repetidamente, o impacto é muito maior nessas comunidades aquáticas. Já existem muitos dados de mortalidade de certas espécies de anfíbios e répteis em função da aplicação do glifosato.

IHU On-Line – Acredita que deve se proibir o glifosato?

Rubens Nodari – Na verdade, todo veneno deveria ser proibido. Compostos que são desenvolvidos para matar não fazem parte da ética da vida. Quem defende a vida não pode ser favorável ao uso de sustâncias que a comprometem. Então, a humanidade só deveria usar em casos extremos esse tipo de produto, e não de forma corriqueira como hoje é usado. Existem outras formas de fazer agricultura em que não precisamos usar venenos. Temos sistemas agroecológicos que são perfeitamente passíveis de serem utilizados para produzir alimentos, fibras, óleos etc., sem necessidade de usar agrotóxico. Então, um produto como esse deveria ser, naturalmente, proibido em função dos danos e dos impactos que ele causa tanto na saúde humana quanto ao meio ambiente.

A impressão que tenho é que nós deveríamos recomendar aos agrônomos que evitem fazer o receituário desses produtos. E aos agricultores que tomem cuidado e não usem produtos como esse em larga escala porque os primeiros prejudicados serão os próprios agricultores.

(Ecodebate, 12/04/2010) publicado pelo IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.

Agrotóxico é problema de saúde pública.


Entrevista com Wanderlei Antonio Pignati
O Brasil bateu recorde no consumo de agrotóxicos no ano passado. Mais de um bilhão de litros de venenos foram jogados nas lavouras, de acordo com dados do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Agrícola. O país ocupa o primeiro lugar na lista de países consumidores desses produtos químicos.

Com a aplicação exagerada nas lavouras no Brasil, o uso de agrotóxicos está deixando de ser uma questão relacionada especificamente à produção agrícola e se transforma em um problema de saúde pública.

“Os impactos negativos são no trabalhador, que aplica diretamente, na sua família, que mora dentro das plantações de soja, na periferia da cidade, porque a pulverização é quase em cima das casas. Tem também o impacto no ambiente, com a contaminação por agrotóxicos das águas”, afirma o médico e professor da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Wanderlei Antonio Pignati, em entrevista exclusiva à Página do MST.

O pesquisador da Fiocruz, doutor em saúde e ambiente fez estudos sobre os impactos dos agrotóxicos no Mato Grosso, que demonstram que nas regiões com maior utilização de agrotóxicos é maior a incidência de problemas de saúde agudos e crônicos.

Por exemplo, intoxicações agudas e crônicas, má formação fetal de mulheres gestantes, neoplasia, distúrbios endócrinos, neurológicos, cardíacos, pulmonares e respiratórias, além de doenças subcrônicas, de tipo neurológico e psiquiátricos, como depressão.

Abaixo, leia a entrevista com o professor Wanderlei Antonio Pignati.

Em 2009, o Brasil utilizou mais de 1 bilhão de litros de agrotóxicos. Por que a cada safra cresce a quantidade de venenos jogados nas lavouras?

O consumo de agrotóxicos dobrou nos últimos 10 anos. Passamos a ser o maior consumidor mundial de agrotóxicos. No Mato Grosso, 105 milhões de litros de agrotóxicos foram usados na safra agrícola passada, com uma média de 10 litros por hectare de soja ou milho e 20 litros por hectare de algodão. Tem vários municípios que usaram até 7 milhões de litros em uma safra. Isso traz um impacto muito grande para a saúde e para o ambiente. A utilização tem aumentado porque a semente está dominada por seis ou sete indústrias no mundo todo, inclusive no Brasil. Essas sementes são selecionadas para que se utilize agrotóxicos e fertilizantes químicos. Isso para aumentar a produtividade e os lucros dessas empresas do agronegócio. Paralelamente, vem aumentando também o desmatamento, com a plantação de novas áreas, aumentando a demanda por agrotóxicos e fertilizantes químicos. No Mato Grosso, passou de 4 milhões para 10 milhões de hectares plantados na última safra. O desmatamento é a primeira etapa do agronegócio. Depois entra a indústria da madeira, a pecuária, a agricultura, o transporte e o armazenamento. Por fim, a verdadeira agroindústria, com a produção de óleos, de farelo e a usina de açúcar, álcool, curtumes, beneficiamento de algodão e os agrocombustíveis, que fazem parte do agronegócio. Isso vem se desenvolvendo muito, pela nossa dependência da exportação. Isso tudo fez com que aumentasse o consumo de agrotóxicos no Brasil.

Quanto mais avança o agronegócio, maior o consumo de agrotóxicos?

Sim. As sementes das grandes indústrias são dependentes de agrotóxicos e fertilizantes químicos. As indústrias não fazem sementes livres desses produtos. Não criam sementes resistentes a várias pragas, sem a necessidade de agrotóxicos. Não fazem isso, porque são produtores de sementes e agrotóxicos. Criam sementes dependentes de agrotóxicos. Com os transgênicos, a situação piora mais ainda. No caso da soja, a produção é resistente a um herbicida, o glifosato, conhecido como roundup, patenteado pela Monsanto. Aí o uso é duas ou três vezes maior de roundup na soja. Isso também aumenta o consumo de agrotóxicos.

Mas a CTNBio liberou diversas variedades de transgênicos, com o argumento de que se diminuiria a necessidade de agrotóxicos…

É só pegar o exemplo da soja transgênica, que não é resistente a praga nenhuma, para perceber como é mentira. Temos que desmascarar a nível nacional e internacional. A soja transgênica não é resistente a pragas, mas a um herbicida, o glifosato. Então, é ainda maior a utilização de agrotóxicos. Eles usam antes de plantar, depois usam de novo no primeiro, no segundo e no terceiro mês. Dessa forma, aumenta em três vezes o uso do herbicida na soja transgênica. Agora vem o milho transgênico, que também é resistente ao glifosato. Com isso, vai aumentar ainda mais o consumo de agrotóxicos. Em geral, os transgênicos resistentes a pragas ainda são minoria.

Quais os efeitos dos agrotóxicos para a saúde e para o ambiente?

Os impactos negativos são no trabalhador, que aplica diretamente, na sua família, que mora dentro das plantações de soja, na periferia da cidade, porque a pulverização é quase em cima das casas. Tem também o impacto no ambiente, com a contaminação por agrotóxicos das águas. Ficam resíduos dos agrotóxicos nos poços artesianos de água potável, nos córregos, nos rios, na água de chuva e no ar. Isso faz com que a população absorva esses agrotóxicos.

Quais as consequências?

São agravos na saúde agudos e crônicos. Intoxicações agudas e crônicas, má formação fetal de mulheres gestantes, neoplasia (que causa câncer), distúrbios endócrinos (na tiroide, suprarrenal e alguns mimetizam diabetes), distúrbios neurológicos, distúrbios respiratórias (vários são irritantes pulmonares). Nos lagos e lagoas, acontece a extinção de várias espécies de animais, como peixes, anfíbios e répteis, por conta das modificações do ambiente por essas substâncias químicas. Os agrotóxicos são levados pela chuva para os córregos e rios. Os sedimento ficam no fundo e servem de alimentos para peixes, répteis, anfíbios, causando impactos em toda a biota em cima da terra.

Como vocês comprovaram esses casos?

Para fazer a comprovação desses casos, é preciso comparar dados epidemiológicos de doenças de regiões que usam muito agrotóxico com outras que usam pouco. Por exemplo, nas três regiões do Mato Grosso onde mais se produz soja, milho e algodão há uma incidência três vezes maior de intoxicação aguda por agrotóxicos, comparando com outras 12 regiões que produzem menos e usam menos agrotóxicos. Analisando por regiões o sistema de notificação de intoxicação aguda da secretaria municipal, estadual e do Ministério da Saúde, percebemos que onde a produção é maior, há mais casos de intoxicação aguda, como diarréia, vômitos, desmaios, mortes, distúrbios cardíacos e pulmonares, além de doenças subcrônicas que aparecem um mês ou dois meses depois da exposição, de tipo neurológico e psiquiátricos, como depressão. Há agrotóxicos que causam irritação ocular e auditiva. Outros dão lesão neurológica, com hemiplegia, neurite da coluna neurológica cervical. Além disso, essas regiões que produzem mais soja, milho e algodão apresentam incidência duas vezes maior de câncer em crianças e adultos e malformação em recém nascidos do que nas outras regiões que produzem menos e usam menos agrotóxicos. Isso porque estão usando vários agrotóxicos que são cancerígenos e teratogênicos.

Qual o perigo para os consumidores de alimentos? Quais as iniciativas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)?

A Anvisa está fazendo a revisão de 16 agrotóxicos, desde que lançou um edital em 2008. Quatorze deles são proibidos na União Europeia, nos Estados Unidos e Canadá por serem cancerígenos, teratogênicos, causam distúrbios neurológicos e endócrinos. Nessa revisão, já tem um resumo desses agrotóxicos, que são proibidos lá fora. Mas aqui são vendidos livremente, mesmo se sabendo desses efeitos crônicos. A Anvisa tem o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em alimentos, no qual faz a análise de 20 alimentos desde 2002. Nesses estudos, acharam resíduos nos alimentos, tanto de agrotóxicos não proibidos como acima do limite máximo permito. O endosulfan, por exemplo, é um inseticida clorado, que é cancerígeno e teratogênico, proibido há 20 anos na União Europeia, nos EUA e no Canadá. Não é proibido no Brasil, sendo muito usado na soja e milho. Esse limite máximo de resíduos é questionável, porque a sensibilidade é individual. Para uma pessoa, o limite máximo para desenvolver uma doença é 10 mg por dia e para outra basta 1 mg. Sem contar a contaminação na água, no ar, na chuva, porque devemos juntar todos esses fatores.

Como você avalia a legislação brasileira para os agrotóxicos e o trabalho da Anvisa?

A Anvisa vem fazendo um bom trabalho, com base na legislação. No entanto, todo dia os grandes burlam a lei. Não só a lei nacional sobre agrotóxicos, mas também o Código Florestal, as Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego (que obrigada a dar os equipamentos aos trabalhadores), as normas do Ministério da Agricultura (que impede a pulverização a menos de 250 metros da nascente de rios, córregos, lagoas e onde moram animais ou habitam pessoas). No Mato Grosso, passam todos os tipos de agrotóxicos de avião, não respeitando as normas.

Os fazendeiros dizem que, se usar corretamente os agrotóxicos, não há perigo.

Tem problema sim. Se o trabalhador ficar como um astronauta, usando todos os equipamentos de proteção individual necessário, pode não prejudicar a sua própria saúde, mas e o ambiente? Todo agrotóxicos é toxico, tanto da classe um como da classe quatro. Aonde vai o resíduo desse agrotóxico? Vai para a chuva, para os rios, para os córregos, para o ar e evapora e desce com a chuva. Não existe uso seguro e correto dos agrotóxicos para o ambiente. Temos que discutir que o uso de agrotóxicos é intencional. As ditas pragas da lavoura – que eu não chamo de pragas – seja um inseto, uma erva daninha ou um fungo, crescem no meio da plantação. Aí o fazendeiro polui o ambiente intencionalmente para tentar atingir essas pragas. Não tem como ele retirar especificamente as pragas, colocar em uma redoma e aplicar o agrotóxico. Ou seja, ele polui de maneira intencional o ambiente da plantação, o ambiente geral, o trabalhador e a produção. Uma parte dessa agrotóxicos fica nos alimentos.

As indústrias do agronegócio argumentam que é necessário o uso de grandes quantidades de agrotóxicos porque o Brasil é um país tropical, com grande diversidade climática. É verdade?

Não tem uma necessidade maior. Não é que o Brasil precise de mais por conta dessa questão climática. Nas monografias dos agrotóxicos, tem uma temperatura ideal para passar, em torno de 20º e 25º. Onde tem essa temperatura no Mato Grosso, por exemplo? Dá mais de 30 graus. Com isso, essas substâncias evaporam e usam ainda mais. Em vez de usar dois litros, colocam 2,5 litros por hectare. É um argumento falso. Tem que colocar agrotóxico porque a semente é dependente. Existem formas de fazer uma produção em grande escala sem a semente dependente de agrotóxicos e fertilizantes químicos. Há vários exemplos no mundo e no Brasil. Mas 99% de toda a nossa produção agrícola depende das sementes da indústrias, que não faz a seleção para não precisar de químicos.

Dentro desse quadro, qual é a tendência?

A tendência é aumentar a utilização de agrotóxicos. Por isso, é preciso uma política mais contundente do governo, dos movimentos de agroecologia e dos consumidores, que cada vez mais consomem agrotóxicos. É preciso discutir o modelo de produção agrícola que está ai. Com o milho transgênico, vai se utilizar mais glifosato. Há um clico de aumento dos agrotóxicos que não vai ter fim. Se analisar a resistência das pragas, há ervas daninhas resistentes ao glifosato. No primeiro momento, se aumenta a dose para vencer a praga. Em vez de cinco litros por hectare, usam sete litros. Num segundo momento se usa um herbicida ainda mais forte ou mais tóxico para combater a erva daninha resistente ao agrotóxico mais fraco. Isso não tem fim. Há grandes áreas de ervas daninhas resistentes nos Estados Unidos, na Argentina e está chegando no Brasil, no Rio Grande do Sul, no Paraná e no Mato Grosso. É um modelo insustentável.

Entrevista realizada por Igor Felippe Santos, da Página do MST.

EcoDebate, 24/05/2010

Educação Alimentar: Somos o que comemos…




Educação é tudo…
É a construção do ser humano…
Doença é falta de educação.
Roubo, assassinato, agressão é falta de educação.
Falta de alimento e fome é falta de educação.
Explorar o próximo é falta de educação.
Ser explorado também é falta de educação.
Legislar em interesse próprio é falta de educação.
Estresse, depressão, angustia existencial, pânico, tudo isso é apenas falta de educação.
Trair a relação afetiva é falta de educação.

Será que toda e qualquer situação de sofrimento do homem é falta de educação? Como avaliar a qualidade da educação de uma pessoa?

Através do conjunto de suas atitudes e hábitos – dentre elas, como e de que forma a pessoa se alimenta. “Somos o que comemos”: pode-se acrescentar também, o que, como, e o quanto comemos, à medida que deixamos de fazê-lo e passamos a nos alimentar progredimos: ao ponderar que o excesso de alimento que dana nossa saúde pode ser repassado a outro que não tem acesso a ele, assim, nos tornamos mais saudáveis e éticos.

Observando uma criança comendo é possível também avaliar a qualidade de seus pais; tanto como pessoa quanto como educadores. Exemplo, a popular desculpa da pressa da vida moderna e da falta de tempo para preparar alimentos mais saudáveis; no fundo é um esconderijo da preguiça.

Prestar atenção ás falas do dia a dia pode ser muito útil:
- Meu filho não come verduras! – O meu detesta frutas! – Legumes? Nem pensar! – Não sei mais o que fazer para essa criatura comer!
- Sinceramente não sei como essa criança consegue parar em pé, ela não come nada!
- Meu neto é uma beleza, não tem esse problema, parece “lima nova” traça tudo que aparece pela frente! – se deixar ele come o dia inteiro!…
Conversa de mãe e de avó em qualquer lugar onde possam trocar figurinhas a respeito dos filhos. Principalmente na sala de espera dos pediatras.

Educação alimentar parece um bicho de sete cabeças capaz de engolir as boas intenções dos pais em educar os filhos.

Comer qualquer um come; até sem fome. Aprender a se alimentar já exige melhor qualidade humana. Evidente que a atitude mais inteligente seria começar certo; mas, a maioria de nós só desperta para a educação alimentar depois de criado um problema; daí vira reeducação, reforma – sempre sai mais caro reformar do que construir direito.

Antes de se tentar mudar os hábitos alimentares é preciso rever alguns conceitos. Pois, fixar conceitos e mantê-los em épocas de grandes mudanças como na atualidade é um risco para a qualidade de vida e até para a própria sobrevivência dos teimosos e dos que pensam pouco.

Aprender a buscar comida para manter-se vivo é um artifício natural para o progresso das espécies.

Faz parte do chamado instinto de sobrevivência. Para o animal é fácil, cada espécie sabe o que comer, quando e quanto, sem ninguém precisar ensinar. Para o homem a situação complicou-se com a capacidade de pensar e de escolher, a tal da liberdade ou livre arbítrio tornou-se um sério problema para quem tem preguiça de pensar e má vontade em reformar hábitos.

Por que mudar o costume? Antigamente o ato de se alimentar envolvia poucos riscos, o maior problema era não ter o que comer. Se as opções são restritas a chance de errar é bem menor, tudo é mais fácil quando as opções são poucas e localizadas, e quando cada coisa tem a sua época certa, naturalmente. A qualidade humana para resolver situações desse tipo não precisa ser lá essas coisas, basta esticar o braço e colocar na boca o que está á mão e pronto. Hoje, a situação é bem diferente há milhares de opções cada uma mais atraente e perigosa do que as outras.

Daqui á frente a seleção natural vai estar com a corda toda; quem não quiser pensar que se cuide, vai transformar seu corpo numa lata de lixo químico.

Não custa nada revisar alguns conceitos sobre educação alimentar:

FALTA DE APETITE
Pouca fome ou muita fome é um conceito subjetivo e pessoal. Quando o adulto fala a respeito do apetite da criança, a maior parte das vezes está se projetando nela; medindo-a com a régua da sua própria fome e dos chavões culturais que recebeu e, incorporou ao seu sistema de crenças sobre o ato de alimentar-se. Exemplo, pais gulosos ou comilões representam um sério perigo para uma educação alimentar infantil de boa qualidade.

ANOREXIA
A ausência total de fome é comum na criança que vive um momento de doença febril ou um distúrbio digestivo grave. Nesse caso, o desaparecimento da fome é um mecanismo automático, instintivo de sobrevivência e de defesa contra a doença. Principalmente contra a imposição que o adulto lhe faz da comida, como se o ato de comer e em grande quantidade fosse condição essencial de saúde e de vida.

Na vigência da doença o corpo da criança está tentado se recuperar concentrando suas defesas orgânicas para tentar resolver um problema momentâneo e localizado. Para tanto, a digestão deve ser interrompida temporariamente para facilitar o processo de recuperação.

Como um paradoxo, muitas vezes na doença febril uma das importantes causas primárias que possibilitaram a infecção foi o excesso de toxinas resultantes da dieta inadequada e excessiva, que o corpo da criança não foi capaz de eliminar pelas fezes, suor e urina. O mecanismo da febre tem como uma de suas importantes funções, além de ativar o sistema imunológico, neutralizar o excesso de toxinas (“queimar”); que põe o corpo em perigo. Doenças febris repetitivas; dentre outras coisas, sinalizam a necessidade de revisar a dieta.

O estilo de vida atual cria desastres como a anorexia mórbida que resulta dum choque de paradoxos: criança bela e vencedora é a gordinha – adulto belo e vencedor são os magros; nesse distúrbio cultural quem sofre mais são as mulheres.

APETITE SELETIVO
Simpatia e aversão a determinados alimentos é natural, e ás vezes até um problema de nascença.

A origem mais comum do apetite seletivo na maior parte das crianças enjoadas para comer: gosto disto; odeio comer aquilo; é decorrente dos seguidos episódios da anorexia das doenças febris não respeitados pelo adulto; pois, quando o apetite da criança some os pais ficam inconformados e desesperados; daí, eles partem para as guloseimas e o que a criança gosta. Há um fundo cultural capaz de justificar, apenas em parte, esse erro grosseiro, disseram para essas pessoas e elas acreditaram que, se a criança não come não vai sarar e pode até morrer; no entanto durante os primeiros anos de vida da criança, isso vai se repetir seguidas vezes e mesmo assim as pessoas não querem livrar-se dessa cultura da comilança; nem perceber nem aprender com as lições do cotidiano.

Na recusa ao alimento normal do cardápio da criança oferecem todo tipo de tranqueira. Para o adulto desprevenido não importa o que a criança coma, interessa apenas que coma alguma coisa.

Outro componente importante na formação de hábito alimentar seletivo é a falta de qualidade do pensar do adulto que só prepara e oferece o que a criança gosta. O desastre existencial é fantástico; essas crianças tornam-se pessoas ortodoxas demais; que não ousam experimentar o novo; e correm o risco de levar uma existência medíocre em todos os sentidos.

Apenas para aprender; selecionem uma pessoa conhecida que come sempre a mesma coisa; que não experimenta nada diferente – vida amorosa pobre; vida profissional medíocre; pois, aprendeu a vida toda a fechar portas e não a abri-las ao novo…

Infelizmente a maioria de nós vai precisar reciclar os hábitos de alimentação depois de adultos; e não raro; á força – espremidos por uma contingência ou doença.

Mas, na nossa eterna vida nunca é tarde para começar nada – quando encaramos cada nova situação como um novo desafio de aprendizado.

O que fazer?

De forma resumida:
Numa primeira fase de progresso “sentimos” os alimentos que nos fazem mal; depois, os que nos fazem bem; a seguir os que nos ajudam a pensar com mais clareza; depois os que nos trazem sensação de plenitude espiritual por serem mais desmaterializados. Nossa dieta espelha o grau de evolução: ancorados no plano físico mais grosseiro necessitamos de alimentos mais “pesados”; ao avançar, as necessidades diminuem em quantidade e melhoram em qualidade.

Além disso:
A dieta pode ser usada como exercício de força de vontade; pois ao a ajustarmos precisamos fazer pequenas “renúncias” diárias fortalecendo-a ao perseverar.

Qual a dieta ideal?
Conforme colocaremos na palestra do feriado de junho em Curitiba:
“A dieta ideal ou a do Apóstolo Paulo” permite comer de tudo; a inteligência é que mostra se devemos ou não; conduzida pela razão torna-se simples, ecologicamente correta e justa; desenvolve a humildade, pois quem a busca sem estar doente reconhece a perda de um estado de saúde orgânica, estético ou mental. Dentre outras coisas bem mais relacionadas ao simples estado físico de saúde ou doença.

Aprender a se alimentar implica na percepção energética do universo e ajuda a abandonar a visão de mundo puramente material; o ato de alimentar-se pode adquirir um significado transcendental; pois alimento é vida e se a recebo da natureza como retribuo?

A simples atitude de questionar-se ao receber o alimento pode oferecer um novo sentido para muitas vidas.

Alimentar-se também é aprender e praticar ecologia e ética; é saber receber e trocar; e, não apenas enfiar alimento “goela abaixo”; a energia tem que fluir para que exista vida e, é preciso manter aberto o circuito executando trocas, pois quem o mantém fechado retém o excesso que não flui, engorda, adoece ou morre; na verdade receber funde-se com entregar, passar adiante o que não é nosso e, reter naquele momento o que não é próprio cria doenças e morte. O conceito de amar ao próximo como a si mesmo (Jesus) é na realidade um conceito de recebimento-troca na sua pureza energética plena, até no ato de comer.
Mas, como repassar as verdades da vida aos comedores de chip?

A vida em si é um infindável recurso pedagógico. Quer se conhecer analise friamente seus hábitos de alimentação.

Quer saber como será a vida com seu novo amor?
Preste atenção ao que ele come; á maneira como o faz – e Bingo!
Já dá prá saber o que esperar dessa amada criatura.
Só gosta de comer tranqueiras – cuidado; pois, o efeito espelho da nossa personalidade na dieta é vero.

NA VIDA SÓ NÃO APRENDE QUEM NÃO QUER.

Américo Canhoto

Conversão de Energia Térmica Oceânica: Empresas começam a explorar a energia dos oceanos


Diagrama do ciclo OTEC. Imagem Wikipedia

O processo de gerar energia renovável a partir das águas do oceano por meio da Conversão de Energia Térmica Oceânica (Ocean Thermal Energy Conversion), conhecida como OTEC (na sigla em inglês), vem sendo estudado a quase um século mas, embora várias usinas-piloto tenham sido construídas para provar que a tecnologia funciona, ela nunca foi colocada em operação comercial. Agora, entretanto, apesar dos altos custos envolvidos, várias companhias estão trabalhando para desenvolver projetos comerciais.

A OTEC gera energia explorando o diferencial de temperatura entre a água quente da superfície e a água fria das profundezas do oceano. A água da superfície é bombeada através de um trocador de calor, onde atinge um fluido com ponto de ebulição muito baixo, como a amônia, que se expande ao evaporar. O gás vaporizado move as turbinas que produzem eletricidade, antes de ser bombeado para um condensador, onde é resfriado pela água fria dos oceanos, fazendo com que retorne ao seu estado líquido. O líquido é então bombeado de volta para o trocador de calor com água quente para repetir o ciclo. Reportagem de Sonia Kolesnikov Jessop, no International Herald Tribune.


Para funcionar eficientemente, a tecnologia exige uma temperatura diferencial de pelo menos 20 graus Celsius. Ela pode ser encontrada em grandes extensões dos mares tropicais. “Cada grau adicional ajudará a produzir 15% mais energia”, diz Philippe Dubau, gerente geral da Pacific Otec, subsidiária da Pacific Petroleum, uma distribuidora de derivados de petróleo na Polinésia Francesa, Nova Caledônia e Vanuatu que vem entrando na setor da energia renovável.

De acordo com Kevin Joyce, consultor de energias renováveis da Black & Veatch, em Overland Park, Kansas, uma das características mais interessantes dessa tecnologia é que, diferentemente da maioria das fontes de energia, ela pode garantir um nível mínimo de fornecimento estável e confiável.

“Isso geraria eletricidade 24 horas por dia de uma forma previsível e confiável”, diz Joyce. “Outras tecnologias renováveis com esse tipo de recurso potencial, como a energia eólica ou solar, são intermitentes, o que significa que elas precisam da energia convencional para cobrir as falhas no fornecimento.”

Às vezes, diz ele, isso significa ter de construir mais usinas elétricas convencionais de resposta rápida para fornecer energia ao sistema quando as fontes renováveis falham. A OTEC, por outro lado, “pode evitar essa necessidade e até mesmo substituir algumas de nossas usinas de fornecimento constante”.

“Isso significa que há mais potencial para a redução de CO2 do que muitas outras tecnologias renováveis”, diz Joyce. E também existem outras vantagens. “A tecnologia é compacta em comparação à que é necessária para energia eólica ou solar”, diz ele, acrescentando que a usina ficará “no meio do oceano e longe da vista.”

A Pacific Otec está trabalhando com a DCNS, uma companhia de arquitetura naval e construção militar do governo francês, e a Xenesys, uma companhia japonesa especializada em dessalinização e na tecnologia de conversão de energia térmica, num estudo de viabilidade para uma usina comercial de OTEC no Taiti. O apoio financeiro para o projeto é fornecido pelos governos da França e da Polinésia Francesa, que estão pagando 50% e 18%, respectivamente, do custo do estudo de viabilidade.

O projeto tem como objetivo construir uma plataforma oceânica de OTEC, com uma capacidade de geração de 10 megawatts-hora, que será conectada à rede elétrica do Taiti e poderá produzir eletricidade suficiente para suprir 10% da demanda das ilhas”, disse Dubau.

“Estamos na mesma situação que as pessoas que construíram o primeiro motor a vapor”, diz ele. “Ainda há um caminho muito longo e difícil à frente, mas se conseguirmos, poderemos fazer algo interessante e relevante em termos de fornecimento de energia e água para as comunidades, então vale a pena tentar.”

O projeto do Taiti colocará uma usina OTEC de 25 metros de altura e submersa a 25 metros abaixo da superfície para evitar as ondas altas e correntezas fortes.

“Abaixo do nível do mar é muito mais estável”, disse Dubau. “O estudo de viabilidade não é para a tecnologia; nós sabemos que ela funciona. Também sabemos que o projeto da usina está correto. Mas o que precisamos fazer agora é projetar o melhor sistema energético considerando os dados do ambiente local; projetar a integração do processo no tipo de plataforma escolhida; e, é claro, estudar a viabilidade econômica do projeto inteiro.”

O trabalho de design e engenharia do estudo que durará um ano será supervisionado pela DCNS, e a Xenesys fornecerá a tecnologia do sistema de geração. Depois da fase da viabilidade, a DCNS deverá assumir um contrato para construir uma usina comercial, diz ele.

A ciência por trás da conversão de energia térmica foi explorada pela primeira vez na França no final do século 19 e uma usina experimental de OTEC foi construída e brevemente operada por um engenheiro francês, Georges Claude, em Cuba em 1930. Nos anos 70, durante a primeira crise do petróleo, vários países começaram a olhar mais seriamente para a tecnologia. Uma usina de teste foi construída com financiamento do governo norte-americano em Keahole Point no Havaí, e outra pela Tokyo Electric Power do Japão, na ilha de Nauru.

Nos anos 80, entretanto, os preços do petróleo caíram, e a atenção se desvaneceu.

“Não fazia sentido na época desenvolver a tecnologia”, disse Dubau. “Ela ainda é extraordinariamente cara porque exige muita inovação, não só no processo propriamente dito mas também na tubulação.”

Como a tecnologia usa um volume muito grande de água fria das profundezas do oceano, ela exige uma tubulação extremamente longa e de calibre largo. “São necessários materiais especiais para construir tubulações com três a cinco metros de diâmetro, o que é extraordinariamente grande, e os canos precisam ir até cerca de mil metros de profundidade, para pegar a água fria”, diz Dubau.

Michinaga Takeda, engenheiro da Xenesys para o projeto do Taiti, disse que sua companhia também havia feito alguns estudos preliminares para uma usina OTEC em terra em Cuba que utilizaria o calor dispensado por uma indústria de energia térmica para aumentar a temperatura da água da superfície do mar. Ele disse que a combinação da construção em terra e o uso do calor reciclado poderia resultar em custos menores e maior eficiência; mas o projeto foi interrompido por causa da dificuldade do governo cubano de encontrar fontes externas de financiamento.

Nos Estados Unidos, uma equipe de desenvolvimento de energias alternativas da Lockheed Martin está trabalhando atualmente no projeto de uma usina piloto, com uma capacidade de geração de energia de 5 a 10 megawatts, que poderá funcionar no Havaí em 2014. Mas embora o sistema tenha o mesmo tamanho do estudo de viabilidade da Pacific Otec no Taiti, o protótipo da Lockheed Martin servirá para validar tecnologias para usinas de OTEC muito maiores, com capacidade de gerar mais de 100 megawatts.

Usinas de OTEC maiores poderão se beneficiar com as lições aprendidas na construção e operação da usina piloto, antecipando melhorias como estratégias de manutenção, melhor monitoramento e controle do ciclo termodinâmico, diz Ted Johnson, diretor de desenvolvimento de energia alternativa da Lockheed Martin. A usina piloto também ajudaria a determinar o custo e os riscos técnicos de construir usinas bem maiores, com capacidade para 100 megawatts ou mais.

“Acho que nossa abordagem é diferente da deles”, disse Dubau. “Os EUA querem usar essas usinas para gerar eletricidade para sua base militar em Guam e Diego Garcia, por exemplo. Nós estamos querendo uma usina bem menor que atenderá às necessidades da pequena comunidade das ilhas.”

Tradução: Eloise De Vylder

Reportagem [Harnessing Ocean Power] do International Herald Tribune, no UOL Notícias.

EcoDebate, 25/05/2010

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