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terça-feira, 25 de junho de 2019

A sustentabilidade dos mananciais e a ética do uso da água

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Quando a lei brasileira de recursos hídricos 9.433/97 incorporou em seu texto o uso prioritário da água para consumo humano e a dessedentação dos animais (Art. 10, Inc. III), ela estava assimilando uma escala de valores. Quando falamos em valores – e numa hierarquia de valores -, então estamos falando de ética.
Esses princípios já existiam a partir de uma reflexão global (Princípios de Dublin), quando setores da humanidade deram-se conta que estávamos mergulhando numa crise da água. Ela faz parte de uma crise civilizacional maior, que sobre usa os bens naturais acima do que a natureza pode oferecer, ou num ritmo mais veloz do que ela é capaz de repor. É o que se chama de insustentabilidade.
Mas, há um vácuo na ética da água no Brasil. Não existe na lei brasileira de recursos hídricos nenhum parágrafo que normatize o cuidado com os mananciais, a não ser um princípio geral da referida lei que afirma ser necessária a gestão dos recursos hídricos integrada à gestão ambiental (Art. 30, Inc. III).
Em 2004, quando a Campanha da Fraternidade da CNBB questionou esse vazio, a resposta das autoridades é que essa dimensão estava implícita em outras leis ambientais, sobretudo no Código Florestal. Porém, o Código foi modificado.
Sem a vegetação, a penetração da água que forma os lençóis freáticos se reduz de 60% para 20%. Sabemos que é o rio aéreo da Amazônia que abastece todo sul e sudeste brasileiros, dependendo da evapotranspiração da floresta. Entretanto, quem pretende ter água nessa região, tem que respeitar também os parâmetros ecológicos locais para que ela esteja ao alcance. Logo, a compra de áreas de preservação na Amazônia em troca do desmatamento em nível local não soluciona o problema da recarga dos aquíferos. É preciso preservar a Amazônia e a vegetação local.
Os dois principais programas do governo federal para a água são no sentido de expandir o consumo. O Água para Todos visa realizar o valor primordial no uso da água que é o abastecimento humano. O Oferta de Água visa expandir seu uso econômico. Temos ainda investimentos pelo PAC em abastecimento humano, com o objetivo de ampliar os serviços de saneamento básico. Entretanto, não temos nenhum programa relevante em termos de proteção dos mananciais.
Sem uma visão sistêmica do ciclo das águas e sem uma ética do uso da água que implique o cuidado dos mananciais, comprometeremos sempre mais o abastecimento humano, a dessedentação dos animais e os demais usos.
O óbvio ulula diante de nossos olhos.
Roberto Malvezzi (Gogó), Articulista do Portal EcoDebate, possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.Publicado no Portal EcoDebate

Por que a incerteza sobre a mudança climática deve nos preocupar mais, e não menos


O tema da mudança climática (por vezes chamado imprecisamente de aquecimento global) é muito controverso, o que não tem ajudado seu caso.

Embora os cientistas tenham bastante certeza de que o fenômeno é real e de que nós o estamos causando, muitas outras incertezas têm impedido soluções definitivas.
Aliás, toda essa incerteza sobre as verdadeiras consequências dessa tragédia climática fazem o público – os cidadãos de todo o mundo – negligenciarem o fato de que haverá consequências. Assim, qualquer tomada de ação é adiada e vista com desconfiança.
Um novo estudo da Universidade de Bristol (Reino Unido), no entanto, afirma que a incerteza científica deve nos deixar mais, e não menos preocupados com as mudanças climáticas. Isso porque que o aumento da incerteza exige ainda maior ação para mitigar as consequências do fenômeno.

Os cientistas usaram uma abordagem ordinal – uma série de métodos matemáticos – para resolver a questão: “Quais seriam as consequências se a incerteza é ainda maior do que nós pensamos que é?”.

Eles mostraram que, conforme a incerteza sobre o aumento esperado de temperatura sobe, os danos econômicos a partir dessa mudança sobem também. Maior incerteza também aumenta a probabilidade de exceder os limites de temperatura “seguros” e não atingir as metas para controlá-los (por exemplo, quanto maior a incerteza na elevação do nível do mar, maior ação cautelar para gerir o risco de inundação é necessária).
“Nós entendemos as implicações da incerteza e, no caso do sistema climático, é muito claro que maior incerteza torna as coisas ainda pior. Isto significa que nunca podemos dizer que há muita incerteza para agir”, explica Stephan Lewandowsky, da Universidade de Bristol.

“Alguns apontam para a incerteza como uma forma de minimizar o problema da mudança climática, quando na verdade isso significa que o problema é mais provável de ser pior do que o esperado na ausência dessa incerteza. Este resultado é robusto a um conjunto de pressupostos e mostra que a incerteza não é desculpa para a inação”, complementa outro coautor da pesquisa, Dr. James Risbey do CSIRO Centro de Investigação Marinha e Atmosférica (Austrália).

Em resumo, a mensagem é: se quisermos usar o apelo à incerteza na decisão política, a conclusão é que devemos aumentar nossas ações e nossa preocupação, e não o contrário. [Science20]

4 maneiras pelas quais a mudança climática está criando um filme (real) de terror


Todo mundo sabe ou já ouviu falar do aquecimento global, agora mais precisamente chamado de mudança climática. Quase ninguém está realmente preocupado com seus efeitos, no entanto, ou exigindo que se faça alguma coisa contra o fenômeno – que os cientistas já avisaram que pode nos prejudicar bastante.

Se os pesquisadores quiserem que os cidadãos de todo o mundo prestem a devida atenção à mudança climática, não podem continuar nessa lenga-lenga de “possíveis efeitos” – tem que mostrar o filme de terror completo que ela gera e nos dizer coisas como:

4. A mudança climática está expondo e arruinando múmias de guerras passadas

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Quando você pensa sobre derretimento de gelo e mudança climática, provavelmente se preocupa com coisas como o aumento do nível do mar e ursos polares morrendo. Mas existem outras preocupações vindas do centro desse gelo se liquefazendo lentamente.
Por exemplo, conforme a geleira Presena, no norte da Itália, descongelou gradualmente nas duas últimas décadas, vomitou alguns itens inesperados, como diários, cartas e rifles antigos. Mais recentemente, tornou-se assustadoramente claro quem possuía esses itens – porque eles estavam presos no gelo, também.
A geleira serviu como um túmulo gelado para soldados mumificados durante a Primeira Guerra Mundial, em uma batalha praticamente esquecida na qual os italianos venceram os Kaiserschutzen austríacos. Essa foi muito possivelmente a única batalha na história em que o medo de balas acertando seu crânio foi diminuído pelo medo de ser enterrado vivo por uma avalanche.

3. O aquecimento global liberta vírus que imediatamente passam a matar

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Quando os cientistas analisaram um pedaço de permafrost (tipo de solo congelado encontrado na região do Ártico) de 30.000 anos de idade na Sibéria, descobriram algo fascinante (não no sentido positivo): um vírus zumbi que imediatamente ressuscitou.
Apelidado de Pithovirus sibericum, é o maior vírus já encontrado. E mal os cientistas acabaram de dar um nome para ele, o monstro acordou e começou a destruir amebas. Ou seja, esse vírus, que estava congelado desde que os Neandertais galopavam mamutes, imediatamente passou a matar coisas depois de ser libertado pelo nosso clima agradável.
Felizmente, este germe só tem apetite por amebas e não pode nos fazer mal, mas os pesquisadores que o descobriram levantaram preocupações de que o derretimento do permafrost poderia reviver vírus como o da varíola (ou um outro pior ainda, você entendeu a mensagem. Ou os cientistas devem sugerir a Hollywood um filme que mostre as consequências disso com mais clareza?).

2. A mudança climática permite que “muco de pedra” entupa nossos fluxos de água

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Você sabe como às vezes filmes de terror usam iluminação (ou a falta dela), ritmo e música para construir uma crescente sensação de medo, enquanto em outras vezes pulam direto para o simples e eficaz nojento? Essa segunda opção é a tática da mudança climática, ao encorajar a proliferação de “muco de pedra” (Didymosphenia geminata).
Um novo estudo sugere que a espécie extremamente bizarra de algas, tecnicamente chamada de didymo, viu uma expansão sem precedentes em todo os EUA, Nova Zelândia, Europa e Canadá ao longo das duas últimas décadas, graças à mudança climática. Esse troço adora entupir cursos de água rochosos.
Uma vez que o aquecimento do clima derrete o gelo, está se tornando cada vez mais fácil para esta coisa chegar ao seu ponto de pesca favorito – o que significa que ele vai rapidamente perder a graça (além do fato de que se deparar com um rio entupido com essa coisa provavelmente vai te traumatizar de maneira permanente).

1. O aquecimento do clima cria hordas de mosquitos sugadores de sangue

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No passado, a Dra. Alison Blackwell, maior autoridade em mosquitos da Escócia, fez uma previsão: os invernos mais quentes e úmidos causados pela mudança climática levariam a uma explosão na população de mosquitos (da família Chironomidae). Geralmente não temos medo desses minúsculos insetos, mas pensar em um enxame desses sugadores de sangue vindo na nossa direção (como nas imagens reais acima), prontos para nos atacar e deixar milhares de marcas vermelhas irritáveis, não é uma visão animadora.
Este ano, o prognóstico da doutora se concretizou por completo: o inverno extraordinariamente molhado do Reino Unido criou as condições perfeitas para uma imensa safra de mosquitos. No momento, ainda somos apenas sobremesa para esses bichos, mas é só uma questão de tempo até que eles unam suas cabeças miúdas para formar uma colmeia sanguessuga e devorar o mundo. [Cracked]

Seis efeitos inesperados da mudança climática


Junto com seus efeitos indutores de ansiedade, o assunto das mudanças climáticas também oferece uma oportunidade interessante de considerar os processos fascinantes e interligados do planeta. Dos menores para os maiores componentes da Terra, das bactérias aos vulcões, todos de alguma forma vão sentir os efeitos das mudanças climáticas. Confira seis maneiras inesperadas com que as mudanças climáticas nos impactam:

6. Morte e erosão no deserto


O solo do deserto pode parecer desolado e sem vida, mas na verdade está repleto de bactérias. Colônias de bactérias podem crescer a tal espessura que formam camadas resistentes chamadas “biocrostas” que estabilizam o solo contra a erosão.

Um estudo destas crostas em desertos dos Estados Unidos mostrou que diferentes tipos de bactérias prosperam em diferentes temperaturas. Algumas preferem o calor sufocante do Arizona e Novo México, enquanto outras se saem melhor no clima frio do sul do Oregon e Utah. Como as temperaturas tornam-se mais erráticas com a mudança climática, as bactérias do deserto podem ter dificuldades para se adaptar, deixando os solos dos desertos mais propensas à erosão.

5. Mais erupções vulcânicas


Enquanto o degelo glacial avança, inundações dos oceanos e o nível do mar se elevam, e a distribuição de peso sobre a crosta da Terra muda.
Essa mudança pode causar aumento da frequência de erupções vulcânicas, como sugerem alguns estudos. Evidências desse fenômeno foram detectadas no registro das rochas, com restos de erupções vulcânicas mais abundantes correlacionadas com períodos de derretimento glacial em vários episódios da história da Terra. Os seres humanos no século 21 provavelmente não experimentarão essa mudança, no entanto, uma vez que este efeito deve ficar para algo em torno de 2.500 anos no futuro.

4. Oceanos escurecem

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As alterações climáticas vão aumentar a precipitação em algumas regiões do mundo, resultando em rios com fluxos mais forte. Fortes correntes fluviais vão carregar mais lodo e detritos, e eventualmente todos que desaguam no mar farão o oceano ficar mais opaco. Regiões ao longo da costa da Noruega já experimentam águas do oceano cada vez mais escuras e turvas, com o aumento da precipitação e derretimento glacial nas últimas décadas. Alguns pesquisadores têm especulado que a escuridão é responsável por mudanças nos ecossistemas regionais, incluindo um aumento nas populações de água-viva.

3. Alergias pioram

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Enquanto a mudança climática pode provocar primaveras precoces, a onda de espirros induzidos pelo pólen deve aumentar. Esse fenômeno irá aumentar a carga total de pólen a cada ano, e poderia fazer as alergias das pessoas piorarem. Alguns modelos de temperatura e precipitação mostraram que os níveis de pólen poderiam atingir mais que o dobro até o ano 2040.

2. Invasões de formigas

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Pheidole megacephala, também conhecida como a formiga de cabeça grande, é uma das
 cem espécies mais invasivas da Terra. Hordas desses insetos prosperam na América do Sul, Austrália e África, e suas populações vorazes espalharam-se rapidamente. Como animais invasores, elas roubam o habitat e os recursos de espécies nativas, prejudicando os ecossistemas regionais e pondo em risco a biodiversidade. Elas têm sido conhecidas até por caçar filhotes de aves.

Pesquisadores estimam que 18,5% da superfície terrestre no planeta atualmente suportam a formiga de cabeça grande. Mas à medida que as mudanças de temperaturas avançarem nas próximas décadas, a gama de habitat desses animais de sangue frio, provavelmente, vai diminuir substancialmente. Alguns modelos climáticos sugerem que o alcance habitacional da formiga irá diminuir em um quinto até o ano de 2080. Como insetos nativos irão responder a essas mudanças, no entanto, ainda não está claro.

1. Luz solar inunda leito oceânico polar

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Enquanto se derrete o gelo do mar, mais luz solar irá banhar regiões costeiras de águas rasas em torno dos pólos. Comunidades de vermes do fundo do mar, esponjas e outros invertebrados acostumados a existência na escuridão começarão a experimentar períodos mais longos de luz solar a cada verão. Uma pesquisa recente mostrou que essa mudança poderia alterar significativamente as comunidades, permitindo que algas e plantas marinhas proliferassem sufocando esses invertebrados. Esta transição de comunidades dominantes, de invertebrados para algas, já foi observada nos bolsos do Ártico e costas da Antártida, e poderia diminuir significativamente a biodiversidade nessas regiões. [livescience]

sábado, 8 de junho de 2019

O oceano está à beira de uma extinção em massa




Nos preocupamos muito com a extinção de animais terrestres, mas e o mar?
De acordo com uma análise inovadora de dados de centenas de fontes, os seres humanos estão na iminência de causar danos sem precedentes para os oceanos e os animais que vivem neles.
  • Extinção iminente para 25% dos tubarões e raias


Um estudo do Grupo de Especialistas em Tubarão, da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), descobriu que um quarto dos peixes cartilaginosos do mundo, ou seja, tubarões e raias, correm risco de extinção nas próximas décadas.
Esse número parece absurdo, mas é bastante certeiro. A pesquisa feita pelo grupo foi a primeira a examinar o estado destes peixes em mares costeiros e oceanos de todo o globo e revelou que 249 das 1.041 espécies conhecidas de tubarões, raias e quimeras estão em uma de três categorias de animais ameaçados de extinção da Lista Vermelha da IUCN.

Estudos anteriores documentaram sobrepesca de apenas algumas populações de tubarões e raias. “Agora sabemos que muitas espécies, não apenas os carismáticos tubarões brancos, enfrentam o perigo da extinção”, diz Nick Dulvy, pesquisador da Universidade de Simon Fraser (Canadá) e um dos coautores do estudo. “Não existem verdadeiros santuários para tubarões, onde eles estão a salvo da sobrepesca”.

Tubarões e raias estão em substancialmente maior risco de extinção do que muitos outros animais e têm o menor percentual de espécies consideradas seguras. Usando a Lista Vermelha da IUCN, os autores classificaram 107 espécies de raias e 74 espécies de tubarões como ameaçadas. Apenas 23% de todas as espécies foram rotuladas como “pouco preocupantes” no quesito preservação.

“As espécies maiores de raias e tubarões, especialmente as que vivem em águas relativamente rasas acessíveis à pesca, são as que estão em maior perigo. Os efeitos combinados da superexploração – especialmente para o lucrativo mercado chinês de sopa de barbatana de tubarão – e da degradação de habitat são mais graves para as 90 espécies encontradas em água doce”, explica Dulvy.
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Arraias, incluindo a majestosa jamanta ou raia-diabo, estão em situação geralmente pior do que tubarões.

Durante duas décadas, mais de 300 especialistas analisaram as 1.041 espécies em 17 oficinas do mundo todo, incorporando todas as informações disponíveis sobre sua distribuição, captura, abundância, tendências demográficas, uso de habitat, histórias de vida, ameaças e medidas de conservação.

Porque salvá-los

De acordo com os pesquisadores do recente estudo, se compromissos para proteger estes peixes não forem feitos agora, há um risco real de que os nossos netos não sejam capazes de ver tubarões e raias em estado selvagem.

“Perder estes peixes será como perder capítulos inteiros de nossa história evolutiva”, afirma Dulvy. “Eles são os únicos representantes vivos da primeira linhagem com mandíbulas, cérebros, placentas e sistema imunológico dos vertebrados modernos”.

A mandíbula foi um ganho considerável na evolução das espécies. Muitos anos depois de já haver animais vertebrados, ela ainda não havia sido incorporada no crânio dos seres mais desenvolvidos. Esta vantagem anatômica foi adquirida no mar, e um dos “pioneiros da mandíbula” parece ter sido um ancestral do ser humano. Um estudo da Universidade de Dublin (Irlanda) concluiu que, há cerca de 290 milhões de anos, viveu nas águas do planeta um peixe chamado Acanthodes bronni, o ponto inicial das mandíbulas, cujos parentes próximos mais vivos são os tubarões.

Além de serem parte da nossa história, a perda potencial das maiores espécies de tubarões é assustadora por várias outras razões. “As maiores espécies tendem a ter o maior papel predatório. A perda de predadores de topo afeta toda a cadeia alimentar marinha e tem um efeito de cascata nos ecossistemas marítimos”, esclarece.

43% das espécies de tubarões no litoral brasileiro estão ameaçadas de extinção. Se nada mudar, dezenas de espécies, cujas populações declinaram em até 90% nos últimos 20 anos, estarão extintas nas próximas décadas. A legislação do Brasil proíbe a “caça” de tubarões e permite sua pesca sob certas condições, mas a fiscalização é fraca (por exemplo, uma pesquisa de 2011 mostrou que 21% das nadadeiras de tubarão do mercado de Hong Kong vinham do Oceano Atlântico Ocidental, área que inclui o Brasil e que sugere que nossos pescadores estão envolvidos em atividade ilegal).

O Grupo de Especialistas em Tubarão da IUCN pede aos governos para proteger os tubarões, raias e quimeras através de uma variedade de medidas, incluindo proibição da captura das espécies mais ameaçadas, cotas de pesca com base científica e proteção de habitats-chave. [ScienceDaily]

“Podemos estar sentados em um precipício de um grande evento de extinção”, disse Douglas J. McCauley, ecologista da Universidade da Califórnia em Santa Barbara (EUA), um dos autores da nova pesquisa.

A boa notícia é que ainda há tempo para evitar uma catástrofe. Em comparação com os continentes, os oceanos estão em sua maior parte intactos e selvagens o suficiente para recuperar sua saúde ecológica.

O quadro perigoso

Estudos científicos sobre a saúde dos oceanos são muito sujeitos a incertezas. É mais difícil para os pesquisadores julgar o bem-estar de uma espécie que vive debaixo d’água, milhares de quilômetros de distância, do que acompanhar a saúde de uma espécie em terra.

Além disso, as poucas mudanças que os cientistas observam, em especial nos ecossistemas oceânicos, podem não refletir as tendências em todo o planeta.

Dessa forma, para criar uma imagem mais clara da saúde dos oceanos, a nova pesquisa reuniu dados a partir de uma enorme variedade de fontes, de descobertas fósseis a estatísticas de transporte de contêineres modernos, capturas de peixe e mineração dos fundos marinhos.
Enquanto muitas das informações já existiam, nunca tinham sido justapostas desse modo.
Como resultado, os cientistas concluíram que há sinais claros de que os seres humanos estão prejudicando os oceanos em um grau notável. Algumas espécies estão sendo mais exploradas que outras, mas os maiores danos ainda vêm de perda de habitat em larga escala.
Os recifes de corais, por exemplo, diminuíram em 40% em todo o mundo, em parte como resultado do aquecimento do clima causado pelo homem.
Alguns peixes estão migrando para águas mais frias, mas espécies menos afortunadas podem não ser capazes de encontrar novos lares. Ao mesmo tempo, as emissões de carbono estão alterando a química da água do mar, tornando-a mais ácida, o que também pode prejudicar os animais marinhos.
  • Acidificação dos oceanos atual é a mais rápida em 300 milhões de anos
As operações de mineração é mais um fator que está transformando o oceano. Os contratos de mineração dos fundos marinhos cobrem milhares de quilômetros quadrados debaixo d’água, destruindo ecossistemas únicos e introduzindo poluição no mar profundo.
  • Extinção estaria ocorrendo mil vezes mais rapidamente por causa dos humanos?

Apenas por enquanto

Até agora, os mares tinham sido, em grande parte, poupados da carnificina vista em espécies terrestres.

O registro fóssil indica que um grande número de espécies animais extinguiram-se quando os seres humanos chegaram em continentes e ilhas. Por exemplo, o moa, um pássaro gigante que viveu na Nova Zelândia, foi dizimado na chegada dos polinésios a região em 1300, provavelmente dentro de um século.

Depois de 1800, com a Revolução Industrial, as extinções em terra só aceleraram. Passamos a alterar o habitat dos animais selvagens, detonando florestas, arando pradarias e estabelecendo estradas e ferrovias em todos os continentes.

  • Sexta extinção em massa será causada por humanos
Ao longo dos últimos cinco séculos, os pesquisadores registraram 514 extinções de animais terrestres. No entanto, extinções documentadas no oceano são muito mais raras.
Antes de 1500, algumas espécies de aves marinhas são conhecidas por terem desaparecido. Desde então, os cientistas documentaram apenas 15 extinções, incluindo a foca-monge do Caribe e a vaca-marinha-de-steller.

Provavelmente estes números são subestimados.

Fundamentalmente, somos predadores terrestres, segundo o Dr. McCauley. Mas isso não significa que o mar esteja a salvo. Muitas espécies marinhas que se tornaram extintas ou ameaçadas dependem da terra – como aves marinhas que nidificam nas falésias, tartarugas que põem ovos nas praias etc.

Ainda assim, há tempo para os seres humanos pararem esse dano. O Dr. McCauley e seus colegas argumentam que limitar a industrialização dos oceanos em algumas regiões poderia permitir que espécies ameaçadas se recuperassem em outras.

Os cientistas também acham que reservas têm de ser concebidas com a mudança climática em mente, de modo que as espécies escapem de altas temperaturas e acidez.

Por fim, a desaceleração das extinções nos oceanos precisa de grandes cortes nas emissões de carbono, também. Coisa que o homem não tem conseguindo fazer e nem parece estar se esforçando para tentar. [NYTimes]

Lixões e queima irregular de resíduos liberam 6 milhões de toneladas de gás de efeito estufa ao ano



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Foto: Maira Heinen

A permanência de lixões para descarte de lixo no Brasil e a queima irregular de resíduos respondem por cerca de 6 milhões de toneladas de gás de efeito estufa ao ano (CO2eq), aponta levantamento do Departamento de Economia do Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb). O montante é o equivale ao gás gerado por 3 milhões de carros movidos a gasolina anualmente. O estudo foi divulgado por ocasião do Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado ontem (5), que tem como temática em 2019 – definida pela Organização das Nações Unidas (ONU) – a questão da “Poluição do Ar”.
“Os resultados expressivos revelam um descaso em relação a uma questão que, muitas vezes, é invisível, que é a destinação inadequada de resíduos, mas que apesar de ser aparentemente invisível, impacta de uma maneira profunda na sociedade, principalmente em termos ambientais”, disse o economista do Selurb, Jonas Okawara, responsável pelo estudo. Os dados estão baseados em um cruzamento de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) a partir de um cálculo sugerido pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, pela sigla em inglês), da ONU.
Segundo o levantamento, a emissão dos gases decorrentes da queima de lixo nos depósitos irregulares é equivalente ao movimento anual de uma frota superior a 130 mil carros. A pesquisa aponta que, de acordo com o IBGE, cerca de 7,9% do total de resíduos gerados são queimados na própria residência. “Considerando que cerca de 78,4 milhões de toneladas de resíduos foram geradas no país em 2017, significa dizer que aproximadamente 6 milhões de toneladas de resíduos foram incinerados ilegalmente”, diz o estudo. Partindo desses dados, chegou-se ao resultado de que a queima de lixo irregular é responsável pela geração anual de 256 mil toneladas de CO2.
A produção de gás metano (CH4) oriundo da decomposição dos resíduos levados para lixões, por sua vez, é próximo ao impacto da atividade do vulcão Etna, na Itália, para o aquecimento global. O Selurb aponta que, se essa quantidade fosse revertida em biogás para produção de energia elétrica em aterros sanitários apropriados, seria possível abastecer a área residencial de uma cidade com 600 mil habitantes. Okawara explicou que a produção de CH4 não acaba com a interrupção do despejo irregular de resíduos. O lixo destinado de maneira errada hoje pode deixar de emitir o gás definitivamente daqui a 30 anos.
Solução
Entre as medidas necessárias para mitigar os efeitos a decomposição dos resíduos sólidos, a Selurb destaca o fim dos “cerca de 3 mil lixões existentes no país e instalação de cerca de 500 aterros sanitários capazes de fazer toda a gestão dos resíduos”.
Dados do Selurb e da PwC (PricewaterhouseCoopers) apontam que 53% das cidades brasileiras ainda destinam o lixo incorretamente para vazadouros clandestinos; a cobertura dos serviços de limpeza urbana (coleta porta a porta) está longe da universalização (76%); 61,6% dos municípios ainda não estabeleceram fonte de arrecadação específica para custear a atividade; e o índice de reciclagem no Brasil não passa dos 3,6%.
Para Okawara, as soluções passam por um planejamento e atuação conjunta das esferas municipais, estaduais e federal. Ele avalia, no entanto, que são necessárias medidas punitivas mais severas para fazer avançar a Política Nacional de Resíduos Sólidos.
“Hoje não vai pra frente porque não tem punição mais severa em relação não só aos prefeitos, mas a sociedade em si. A sociedade não tem um engajamento necessário para fazer com que o tempo dos resíduos sólidos possa evoluir da maneira como o tema demanda”, disse.
Camila Maciel, da Agência Brasil, in EcoDebate

Biodiversidade e meio rural



Mata Atlântica

Tanto a comunidade científica internacional quanto governos e entidades não-governamentais ambientalistas vêm alertando para a perda da diversidade biológica em todo o mundo.
A degradação que está afetando o planeta encontra raízes na civilização humana contemporânea, agravada pelo crescimento explosivo da população e pela distribuição desigual da riqueza. A perda da diversidade biológica envolve aspectos sociais, econômicos, culturais e científicos.
Em anos recentes, a intervenção humana em habitats que eram estáveis aumentou significativamente, gerando perdas maiores de biodiversidade. Biomas estão sendo ocupados em diferentes escalas e velocidades.
Site do Ministério do Meio Ambiente destaca que é necessário que sejam conhecidos os estoques dos vários habitats naturais e dos modificados existentes no Brasil, de forma a desenvolver uma abordagem equilibrada entre conservação e utilização sustentável da diversidade biológica, considerando o modo de vida das populações locais.
Como resultado das pressões da ocupação humana na zona costeira, a Mata Atlântica, por exemplo, ficou reduzida a aproximadamente 7% de sua vegetação original. Na periferia da cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, são encontradas áreas com mais de 500 espécies de plantas por hectare, muitas dessas são árvores de grande porte e ainda não descritas pela ciência.
Os principais processos responsáveis pela perda de biodiversidade são a perda e fragmentação dos habitats, a introdução de espécies e doenças exóticas, a exploração excessiva de espécies de plantas e animais, o uso de híbridos e monoculturas na agroindústria e nos programas de reflorestamento, a contaminação do solo, água, e atmosfera por poluentes e as mudanças climáticas.
As inter-relações das causas de perda de biodiversidade com a mudança do clima e o funcionamento dos ecossistemas apenas agora começam a ser vislumbradas.
Razões principais justificam a preocupação com a conservação da diversidade biológica. Primeiro, porque se acredita que a diversidade biológica é uma das propriedades fundamentais da natureza, responsável pelo equilíbrio e estabilidade dos ecossistemas. Segundo, porque se acredita que a diversidade biológica representa um imenso potencial de uso econômico, em especial pela biotecnologia. Terceiro, porque se acredita que a diversidade biológica esteja se deteriorando, com aumento da taxa de extinção de espécies, devido ao impacto das atividades antrópicas.
O Princípio da Precaução, aprovado na Declaração do Rio durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD/Rio-92), estabelece que as ações devem ser imediatas e preventivas.
Biotecnologia significa qualquer aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos, organismos vivos, ou seus derivados, para fabricar ou modificar produtos ou processos para utilização específica. (Artigo 2 da Convenção sobre Diversidade Biológica.
O potencial de utilização sustentável da biodiversidade é dependente da disponibilidade de matéria prima, tecnologia e mercado. Um parente silvestre do trigo originário da Turquia proporcionou genes resistentes a doenças para as variedades comerciais de trigo resultando em ganho anual de US$50 milhões, somente nos Estados Unidos.
Uma variedade de cevada da Etiópia forneceu um gene que protege, atualmente, a cultura da cevada na Califórnia contra um vírus fatal, proporcionando economia de US$ 160 milhões.
Nos Estados Unidos, 25% dos produtos famacêuticos receitados contêm ingredientes ativos derivados de plantas e existem mais de 3000 antibióticos derivados de microrganismos. A exploração farmacológica da biodiversidade brasileira está em seu início e, a julgar pelos resultados obtidos em outros países, acredita-se que exista um vastíssimo campo para a produção de fármacos ainda desconhecidos.
Na área da agricultura o Brasil tem exemplos, de repercussão internacional, sobre o desenvolvimento de biotecnologias que geraram riquezas por meio do adequado emprego de componentes da biodiversidade.
Este é o caso do programa de controle biológico, por meio de “Baculovirus” utilizado no combate à lagarta da soja, que gera economia da ordem de 200 milhões de dólares anuais, para os produtores brasileiros.
Exemplo semelhante e já rotineiro na exploração de cana-de-açúcar é o uso de parasitas para controlar a cigarrinha, prática que representa economia anual superior a 100 milhões de dólares.
De importância estratégica para a produção de soja no Brasil, com reflexos diretos na nossa pauta de exportações, é a economia obtida com as pesquisas que possibilitaram a substituição de fertilizantes nitrogenados por associações simbióticas da planta com bactérias fixadoras de nitrogênio.
Não é preciso interpretar a importância da biodiversidade com viés economicista, mas buscar o equilíbrio do mundo deve ser o caminho.
CAMPANHOLA, C., MORAES, G. J. e SÁ, L. A. N. de. Review of IPM in South America. IN: MENGECH, A. N.; SAXENA, K. N.;
GOPALAN, H. N. B. Integrated Pest Management in the Tropics: Current Status and Future Prospects. John wiley & Sons, Chichesster, England, 1995. p. 121-152.
http://www.mma.gov.br/biodiversidade/biodiversidade-global/impactos -EcoDebate

Nós comemos ao menos 50 mil partículas de plástico por ano


Nós comemos ao menos 50 mil partículas de plástico por ano

Juliana Blume


Uma pessoa come em média 50 mil partículas de microplástico por ano e respira uma quantidade semelhante, de acordo com o primeiro estudo a estimar a ingestão de poluição plástica.

Apesar do resultado do estudo, o número real de partículas ingeridas é provavelmente muito maior, já que poucos alimentos e bebidas foram analisados para determinar a contaminação com plástico.

Os impactos para a saúde de ingerir microplástico ainda são desconhecidos, mas especula-se que essas partículas podem liberar substâncias tóxicas e que os menores fragmentos podem penetrar nos tecidos e causar uma reação do sistema imunológico da pessoa.

Uma pitada de plástico em todas as refeições

A poluição microplástica é criada pela desintegração de lixo plástico e parece ser onipresente no mundo inteiro. Microplásticos foram encontrados no ar, no solo, nos rios e até nas profundezas dos oceanos. Eles foram detectados na água da torneira e na água mineral, nos frutos do mar e na cerveja. Eles também foram encontrados nas fezes humanas, comprovando que as pessoas ingerem essas partículas.
Esta nova pesquisa, publicada na revista Environmental Science and Technology, analisou os dados de outros 26 estudos que mediram a quantidade de partículas de microplástico em peixe, frutos do mar, açúcar, sal, cerveja e água, além do ar das cidades.
Os pesquisadores usaram então recomendações de dieta feitas pelo governo dos EUA para calcular quantas partículas as pessoas provavelmente comem em um ano. Adultos ingerem cerca de 50 mil partículas e crianças 40 mil.
Mas a maioria dos alimentos e bebidas não foi estudada. “Nós não sabemos muita coisa. Existem alguns buracos grandes de dados que precisam ser preenchidos”, diz o pesquisador principal Kieran Cox, da Universidade de Vitória (Canadá).
Outros alimentos, como o pão, produtos processados, carne, laticínios e vegetais podem conter tanto plástico quanto os alimentos analisados. “É muito possível que existam grandes quantidades de partícula de plástico neles”, diz ele. É possível que a real média de consumo anual seja de centenas de milhares de partículas.

Água da torneira x água mineral

Alguns dos dados mais completos que temos é sobre a quantidade de partículas na água de torneira e água mineral. A água mineral contém 22 vezes mais microplástico do que a água da torneira. Quem bebe apenas água mineral consome 130 mil partículas por ano apenas desta fonte, enquanto quem toma água da torneira consome 4 mil partículas por ano.

Partículas inaladas

Pesquisadores ainda não sabem o que acontece quando microplásticos são inalados, mas um novo estudo especula que “a maior parte das partículas inaladas será ingerida” ao invés de ser expelida por tosse ou espirro.

Alerta

O estudo de Cox esclarece que apesar de ainda não conhecermos as consequências desse consumo de plástico, há uma grande chance de haver consequências negativas para a saúde humana. “Poderia ser um alarme potencial, com certeza”, diz ele.
A comissão europeia publicou um relatório em abril de 2019 dizendo que há motivos para se ter uma preocupação genuína em relação ao consumo de microplásticos e que precauções devem ser tomadas para que esses fragmentos não sejam liberados.
Cox diz que o estudo o fez mudar de hábitos. Agora ele evita comprar qualquer produto que contenha plástico demais e sempre que possível ele não bebe mais água mineral.
“Remover plásticos de uso único da sua vida e apoiar empresas que estão se distanciando de embalagens plásticas vai ter um impacto muito grande. Os fatos são simples. Nós estamos produzindo muito plástico e ele acaba no ecossistema, e nós fazemos parte desse sistema”, argumenta.

Propulsor sem combustível

Possibilidade de propulsor sem combustível, possível chave para viagens interestelares, está sendo testada.



Um dos maiores desafios das viagens espaciais está no uso de combustível. Quanto mais combustível uma nave precisa, mais peso ela precisa carregar, algo que pode prejudicar o planejamento de viagens de grande distância. Desde os primeiros anos da era espacial, o sonho de viajar até outro sistema solar foi prejudicado por essa questão, que impõe limites rígidos à velocidade e ao tamanho da espaçonave que lançamos no cosmos. Mesmo com os motores de foguete mais potentes da atualidade, os cientistas estimam que levaria 50 mil anos para chegar ao nosso vizinho interestelar mais próximo, a estrela Alpha Centauri. 

Uma das possibilidades mais radicais de resolver este problema é simplesmente não usar combustível. Parece bom demais para ser verdade, mas alguns cientistas estão trabalhando com essa possibilidade. Existem diversos conceitos avançados de propulsão que, teoricamente, poderiam fazer isso. Um dos que mais empolgam os pesquisadores é o EmDrive. Descrito pela primeira vez há quase duas décadas, o EmDrive funciona convertendo eletricidade em microondas e canalizando essa radiação eletromagnética através de uma câmara cônica.

Em teoria, as microondas podem exercer força contra as paredes da câmara, o suficiente para impulsionar uma espaçonave que já esteja no espaço. Por enquanto, porém, este tipo de propulsão sem combustível existe apenas como um protótipo de laboratório, e ainda não está claro se este sistema é realmente capaz de produzir propulsão. Em caso afirmativo, as forças que ele gera não são fortes o suficiente para serem registradas a olho nu, muito menos propelir uma espaçonave.

Nos últimos anos, no entanto, um punhado de equipes de pesquisa, incluindo uma da NASA, afirma ter tido sucesso com um EmDrive. Se for verdade, isso equivaleria a um dos maiores avanços na história da exploração espacial. O problema é que a propulsão observada nesses experimentos é tão pequena que é difícil dizer se ele é real.

A solução seria projetar uma ferramenta que possa medir essas quantidades minúsculas de propulsão. Assim, uma equipe de físicos da Technische Universität Dresden, da Alemanha, decidiu criar um dispositivo que preenchesse essa necessidade. Liderado pelo físico Martin Tajmar, o projeto SpaceDrive visa criar um instrumento tão sensível e imune à interferência que acabaria com o debate de uma vez por todas.

Em outubro, Tajmar e sua equipe apresentaram seu segundo conjunto de medidas experimentais do EmDrive no Congresso Internacional de Astronáutica, e seus resultados serão publicados na Acta Astronautica em agosto. Com base nos resultados desses experimentos, Tajmar diz que uma solução para a “questão” EmDrive pode estar a apenas alguns meses de distância.

Quebrando as leis da física

Muitos cientistas e engenheiros descartam o EmDrive porque essa abordagem parece violar as leis da física. Microondas empurrando as paredes de uma câmara EmDrive parecem gerar propulsão ex nihilo, o que entra em conflito com a lei da conservação do momento – é tudo ação e nenhuma reação. Seria como criar força do nada.
Os proponentes do EmDrive, por sua vez, recorrem a interpretações da mecânica quântica para explicar como o EmDrive poderia funcionar sem violar a física newtoniana. “Do ponto de vista da teoria, ninguém leva isso a sério”, diz Tajmar, segundo matéria do portal Wired. Se o EmDrive é capaz de produzir propulsão, como alguns grupos afirmaram, ele diz que não há “nenhuma pista de onde esta propulsão está vindo”. Quando há uma falha teórica dessa magnitude na ciência, Tajmar diz que a experimentação é a única maneira de chegar a uma conclusão.


Alpha Centauri, nossa vizinha mais próxima. Imagem: ESO
No final de 2016, Tajmar e outros 25 físicos se reuniram nos EUA para a primeira conferência dedicada ao EmDrive e sistemas de propulsão exóticos e sem combustível. Uma das apresentações mais empolgantes foi dada por Paul March, físico do Laboratório Eagleworks da NASA, onde ele e seu colega Harold White estavam testando vários protótipos do EmDrive. De acordo com a apresentação e um artigo subsequente publicado no Journal of Propulsion and Power, ele e White observaram várias dúzias de micro-newtons de propulsão em seu protótipo. É pouco – a título de comparação, um único motor Merlin da SpaceX produz cerca de 845.000 Newtons de propulsão no nível do mar – mas é alguma coisa. O problema para Harold e White, no entanto, era que sua configuração experimental permitia várias fontes de interferência, então eles não podiam dizer com certeza se o que eles observaram foi realmente propulsão.

Tajmar e o grupo de Dresden usaram uma réplica do protótipo EmDrive usado por Harold e White em seus testes na NASA. O aparelho consiste em um cone de cobre com a parte de cima cortada com pouco menos de trinta centímetros de comprimento, projeto do engenheiro Roger Shawyer, que descreveu pela primeira vez o EmDrive em 2001. Durante os testes, o cone EmDrive é colocado em uma câmara de vácuo. Fora da câmara, um dispositivo gera um sinal de microondas que é retransmitido, usando cabos coaxiais, para antenas dentro do cone.

Medindo o (quase) nada

Esta não é a primeira vez que a equipe de Dresden procura medir quantidades de força quase imperceptíveis. Eles construíram engenhocas semelhantes para seu trabalho em propulsores de íons, que são usados ​​para posicionar precisamente os satélites no espaço. Esses propulsores micro-newton são do tipo que foram usados ​​pela missão LISA Pathfinder, que precisa de uma capacidade de posicionamento extremamente precisa para detectar fenômenos fracos como ondas gravitacionais. Mas, para estudar o EmDrive e sistemas similares de propulsão sem propulsão, diz Tajmar, era necessária uma resolução nano-newton.

A abordagem deles era usar uma balança de torção, um tipo de pêndulo que mede a quantidade de torque aplicada ao seu eixo. Uma versão menos sensível desse equilíbrio também foi usada pela equipe da NASA quando eles presenciaram seu EmDrive produzindo propulsão. Para medir com precisão a pequena quantidade de força, a equipe de Dresden usou um interferômetro a laser para medir o deslocamento físico das escalas de equilíbrio produzidas pelo EmDrive. De acordo com Tajmar, sua escala de torção tem uma resolução nano-newton e suporta propulsores pesando vários quilos, tornando-se o equilíbrio mais sensível que existe.

O próximo passo é determinar se a força detectada é de fato impulsionada e não um resultado de interferência externa. E há muitas explicações alternativas para as observações de Harold e White. Para determinar se um EmDrive realmente produz propulsão, os pesquisadores devem ser capazes de proteger o dispositivo de interferências causadas pelos pólos magnéticos da Terra, vibrações sísmicas do ambiente e a expansão térmica do EmDrive devido ao aquecimento das microondas.

Os ajustes no design do balanço de torção – para controlar melhor a fonte de alimentação do EmDrive e protegê-lo de campos magnéticos – resolveram alguns dos problemas de interferência, diz Tajmar ao Wired. Um problema mais difícil foi como lidar com o “desvio térmico”. Quando a energia flui para o EmDrive, o cone de cobre aquece e se expande, o que desloca seu centro de gravidade o suficiente para fazer com que o balanço de torção registre força que pode ser confundida com propulsão. Tajmar e sua equipe esperavam que mudar a orientação do propulsor ajudasse a resolver esse problema.

Ao longo de 55 experimentos, Tajmar e seus colegas registraram uma média de 3,4 micro-newtons de força do EmDrive, número muito semelhante ao que a equipe da NASA encontrou. Infelizmente, essas forças não parecem passar no teste de deriva térmica. As forças vistas nos dados foram mais indicativas de expansão térmica do que de propulsão.

A esperança ainda existe, entretanto. Tajmar e seus colegas estão desenvolvendo paralelamente dois tipos adicionais de balanças de propulsão, incluindo um supercondutor que, entre outras coisas, ajudará a eliminar falsos positivos produzidos por deriva térmica. Se eles detectarem a força de um EmDrive nesses saldos, há uma grande probabilidade de que ela seja realmente resultado de uma impulsão. Mas, se nenhuma força for registrada, isso provavelmente significa que todas as observações anteriores do EmDrive foram falsos positivos. Um veredicto final deve ser obtido até o final do ano.

Mesmo um resultado negativo desse trabalho, porém, pode não acabar com o EmDrive e a esperança de viajar sem combustível pelo espaço. Existem muitos outros projetos de propulsão sem combustível, e, se os cientistas alguma vez desenvolverem novas formas de propulsão dessa forma, os equilíbrios de propulsão hipersensíveis desenvolvidos por Tajmar e pela equipe de Dresden certamente serão utilizados para diferenciar o que realmente funciona do que ainda está no campo da ficção.

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