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quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Um Mundo Faminto e Envergonhado

De todas as nossas mazelas, a fome é a que mais agride nossa consciência coletiva. Sabemos que muito poderia ser feito para evitar as cenas com as quais nos deparamos nas esquinas de nossas residências, ou para erradicar cenas de países africanos onde a população morre literalmente de fome.

Nessas situações faltou vontade dos governos e das sociedades para resolver essa barbaria, que se aproxima de um holocausto quando vista nas dimensões de um continente como a África.

A comida do dia-a-dia deveria ser direito de todos, indistinta e independentemente de qualquer classe social. Todos deveriam ter o direito de fazer três refeições por dia. Dinheiro para isso os governos têm, ou, se não têm, de onde vieram todos esses recursos que surgiram para pagar o tombo financeiro dado por banqueiros e investidores gananciosos? Afinal, sempre nos foi dito que não havia dinheiro para salvar as vidas desses coitados famintos, que para sua infelicidade o seu maior pecado foi ter nascido na família ou no país errado.

Constatamos agora nesse turbilhão em que vivemos que fortunas foram dizimadas em segundos, e os governos usaram e continuam a usar trilhões de dólares para salvar esse sistema financeiro que, por falta de regulamentação dos próprios governos, chegou a essa situação. A pergunta que todos farão em um futuro muito próximo é: Por que para eles os banqueiros tinham dinheiro e para eliminar a fome no mundo não?

Os presidentes dessas nações, que estão torrando as economias de seus compatriotas, terão que prestar contas para a história e, talvez, para os futuros governantes.

De que valem essas somas estratosféricas transitando pelos computadores das Bolsas de Valores ou dos vários tipos de Fundos de Aplicações, ou das outras instituições criadas para se beneficiar dessa farra financeira, se a coisa mais importante para todos nós, que é a vida, está sendo desprezada e desconsiderada a níveis absurdamente ridículos?

Assistimos nestes últimos anos falarem muito da Rodada de Doha, que foi uma reunião dos países membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) iniciada em novembro de 2001, em Doha, capital do Qatar, e com previsão de término em 2004.

A intenção era que os países aderissem à Agenda de Desenvolvimento de Doha e, a partir daí, negociassem a abertura dos mercados agrícolas e industriais. O objetivo declarado da rodada era que as regras de comércio se tornassem mais livres para os países em desenvolvimento, em função de serem eles os maiores prejudicados com subsídios dos países ricos para os seus agricultores.

Segundo a OMC, o total de subsídios nas áreas de agricultura, serviços e indústria somavam em 2006 cerca de US$ 1 trilhão por ano, ou 4% do Produto Interno Bruto (PIB) global. Só o subsídio dado à agricultura era de US$ 360 bilhões por ano, e continuou a crescer.

Mas o que estava por trás da Rodada de Doha era a tentativa de impedir que os países pobres continuassem a ser massacrados pelos países ricos com esses subsídios destinados a perpetuar a incompetência e o corporativismo de seus agricultores. Essa situação, que persiste até hoje, gera aumento da pobreza de quem já é muito pobre e concentração de riqueza de que já tem muito.

Agora, juntando a crise financeira mundial com o fracasso da Rodada de Doha fica a certeza de que os governantes das nações livres, eleitos pelos seus povos, decepcionaram a todos com sua mesquinhez, arrogância e incompetência para enxergar o óbvio: de nada valerá todo o dinheiro do mundo sem as pessoas alimentadas, felizes e livres.

Enquanto escrevo estas linhas muitas coisas acontecem pelo mundo. Sei que expresso o que milhões pensam ou até dizem, porém, temos que fazer mais do que discordar desse absurdo consentido pela nossa passividade. Temos que começar a mudar as coisas no trabalho, no voto, nas reuniões sociais, nas escolas e universidades, enfim, em todos os lugares onde, pacificamente e de forma civilizada, possamos nos manifestar. E aí quem sabe num futuro próximo possamos viver em um mundo sustentável, alimentado e justo.
Fonte: http://www.ecoesfera.com.br/

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César Torres

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