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quinta-feira, 21 de agosto de 2014

A Terra está doente.

 
Leonardo Boff
 
Que devolvemos à Terra como forma de gratidão e de compensação? Nada. Só agressão, exaustão de seus bens. Estamos conduzindo, todos juntos, uma guerra total contra a Terra. E não temos nenhuma chance de ganharmos essa guerra. Temo que a Mãe Terra se canse de nós e não nos queira mais hospedar aqui. Ela poderá nos eliminar como eliminamos uma célula cancerígena”, escreve Leonardo Boff, teólogo.
 
Segundo ele, “o momento é de resistência, de denúncia e de exigências de transformações nesse Código que  modificado honrará  a vida e alegrará a grande, boa e generosa Mãe Terra“.
 
Eis o artigo.
Lamento profundamente que a discussão do Código Florestal foi colocada preferentemente num contexto econômico, de produção de commodities e de mero crescimento econômico.
 
Isso mostra a cegueira que tomou conta  da maioria dos parlamentares e também de setores importantes do Governo. Não tomam em devida conta as mudanças ocorridas no sistema-Terra e no sistema-Vida que levaram ao aquecimento global.
 
Este é apenas um nome que encobre práticas de devastação de florestas no mundo inteiro e no Brasil, envenenamento dos solos, poluição crescente da atmosfera, diminuição drástica da biodiversidade, aumento acelerado da desertificação e, o que é mais dramático, a escassez progressiva de água potável que  atualmente já tem produzido 60 milhões de exilados.
 
Aquecimento global significa ainda a ocorrência cada vez mais frequente de eventos extremos, que estamos assistindo no mundo inteiro e mesmo em nosso pais, com enchentes devastadoras de um lado, estiagens prolongadas de outro e vendavais nunca havidos no Sul do Brasil  que produzem grandes prejuízos em casas e plantações destruídas.
 
Só cegos e estupidificados pela ganância do lucro não veem as conexões causais entre todos estes fenômenos.
A Terra está doente. A  humanidade sofredora de 860 milhões passou, por causa da crise econômico-financeiro dos países opulentos, onde grassam ladrões, salteadores de beira de estrada das economias populares, a um bilhão e cem milhões de pessoas.
 
Consequência: a questão não é salvar o sistema econômico-financeiro, não é produzir mais grãos, carnes e commodities em geral para exportar mais e aumentar o lucro.
A questão central é salvar a vida, garantir as condições físico-químicas e ecológicas que garantem a vitalidade e integridade da Terra e permitir a continuidade de nossa civilização e do projeto planetário humano.  A Terra pode viver sem nós e até melhor. Nós não podemos viver sem a Terra. Ela é  nossa única Casa Comum e não temos outra. Ela é a Pacha Mama dos andinos, a grande mãe, testemunhada por todos os agricultores e a  Gaia, da ciência moderna que a vê  como um superorganismo vivo que se autorregula de tal forma que sempre se faz apto para produzir e reproduzir vida.
 
Então, é nossa obrigação manter a floresta em pé. É uma exigência da humanidade, porque ela pertence a todos, embora gerenciada por nós . O equilíbrio climático da Terra e a suficiência de água para a humanidade passa pela floresta amazônica. É ela que sequestra carbono, nos devolve em oxigênio, em flores, frutos e biomassa. Por isso temos que manter nossas matas ciliares para garantir a perpetuidade dos rios e a preservação da pegada hidrológica (o quanto de água temos a nossa disposição). É imperioso não envenenar os solos pois os agrotóxicos alcançam o nível freático das águas, caem nos rios,  penetram nos animais pelos alimentos quimicalizamos e acabam se depositando dentro de nossas células, nos intoxicando lentamente.
 
A luta é pea vida, pelo futuro da humanidade e pela preservação da Mãe Terra.  Vamos sim produzir, mas respeitando o alcance e o limite de cada ecossistema, os ciclos da natureza e cuidando dos bens e serviços que  Mãe Terra gratuita e permanentemente nos dá.
 
Que devolvemos à Terra como forma de gratidão e de compensação? Nada. Só agressão, exaustão de seus bens. Estamos conduzindo, todos juntos, uma guerra total contra a Terra. E não temos nenhuma chance de ganharmos essa guerra. Temo que a Mãe Terra se canse de nós e não nos queira mais hospedar aqui. Ela poderá nos eliminar como eliminamos uma célula cancerígena. Devemos devolver seus benefícios, com cuidado, respeito, veneração para que ela se sinta mãe amada e protegida e nos continue a querer como filhos e filhas queridos.
 
Mas não foi a devastação que fomos criados e estamos sobre esse ridente Planeta. Somos chamados a ser os cuidadores, os guardiães desta herança sagrada que o Universo e Deus nos entregaram. E vamos sim  salvar a vida, proteger a Terra e garantir um futuro comum, bom para todos os humanos e para a toda a comunidade de vida, para as plantas, para os animais, para os demais seres da criação.
 
A vida é chamada para a vida e não para a doença e para morte. Não permitiremos que um Codigo Florestal mal intencionado ponha em risco nosso futuro e o futuro de nossos filhos, filhas e netos. Queremos que eles nos abençoem por aquilo que tivermos feito de bom para a vida e para a Mãe Terra e não tenham motivos para nos amaldiçoar por aquilo que deixamos de fazer e podíamos ter feito e não fizemos.
 
O momento é de resistência, de denúncia e de exigências de transformações nesse Código que  modificado honrará  a vida e alegrará a grande, boa e generosa Mãe Terra.
Publicado pelo IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.

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César Torres

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