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quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Especialistas dizem que o Brasil não está preparado para os impactos das mudanças climáticas

                      Nova Friburgo, deslizamento de encosta


Especialistas dizem que país não tem planejamento estratégico para minimizar os efeitos em setores como agricultura, energia e migração regional. Pesquisa mostra o Brasil como o 58º em vulnerabilidade.
 
As imagens dos deslizamentos de terra causados por fortes chuvas e que deixaram centenas de mortos na região serrana do Rio de Janeiro, no início de 2011, ou dos refugiados da seca no Nordeste estão firmes na cabeça de muitos brasileiros. Mas esses são apenas dois dos vários exemplos dos impactos das mudanças climáticas no Brasil. Muitas vezes, os efeitos delas são ainda piores por causa da falta de estrutura das cidades brasileiras.
 
“O Brasil não está totalmente preparado para as mudanças climáticas e seus impactos. Os pontos fracos do Brasil estão relacionados à sua infraestrutura e ao fato de ser um país de enorme extensão e com uma grande população pobre”, frisa o cientista-chefe do Instituto de Adaptação Global (GAIN, em inglês), Ian Noble. Uma recente pesquisa do instituto mostrou que, no quesito vulnerabilidade, o Brasil está na 58ª posição entre 176 países.
 
Segundo os cientistas, cada região brasileira sofre de forma diferente com os impactos das mudanças climáticas. No Sul e no Sudeste, o maior problema são as chuvas cada vez mais intensas – e, com elas, os perigos cada vez maiores para as pessoas que vivem em encostas. Já o Centro-Oeste e principalmente o Nordeste vão passar por secas cada vez mais frequentes. No Centro-Oeste, algumas regiões de savana deverão virar caatinga. Já partes da floresta tropical úmida da Amazônia deverão se converter em serrado e savana.
 
Agricultura, energia e migração
 
A agricultura é o setor econômico mais vulnerável às condições climáticas. As temperaturas mais altas e a variação do regime de chuvas podem obrigar uma série de culturas – como arroz, café, soja e milho – a se deslocar para áreas onde as condições climáticas sejam mais favoráveis. “Isso gera transtornos para a economia e o setor agrícola”, comenta Saulo Rodrigues Filho, diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS) da Universidade de Brasília (UnB).
 
O setor energético brasileiro também é vulnerável, pois depende do regime de chuvas e das hidrelétricas. Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), o nível dos reservatórios é o menor em dez anos e caiu para menos da metade nas principais hidrelétricas do país, o que cria o risco de apagões.
 
O governo federal responde com medidas de curto prazo, como a queima de petróleo para produzir eletricidade. “O governo brasileiro não entende o atual problema como uma vulnerabilidade do setor energético diante das mudanças climáticas”, afirma Cláudio Szlafszstein, do núcleo de meio ambiente da Universidade Federal do Pará (UFPA).
 
Quanto à migração regional, o agravamento das adversidades climáticas poderá fazer ressurgir os refugiados do clima, principalmente na região Nordeste. “As condições climáticas do semiárido nordestino poderão ficar mais adversas e, com isso, deve haver um grande fluxo migratório”, afirmou Saulo Filho.
 
Szlafszstein lembra que o Brasil vivencia o problema da migração interna da população por fatores climáticos há muito tempo, principalmente a nordestina por causa da seca. “Enquanto estudiosos e a ONU usam o termo ‘migrações climáticas’, no Brasil a seca e seus impactos são tidos como problemas crônicos”, comenta.
 
Avanços?
O pesquisador Saulo Filho, da UnB, avalia que o governo brasileiro avançou no combate às mudanças climáticas com a adoção de medidas e de políticas em sintonia com o que a ciência diz ser necessário para minimizar os impactos. Um passo importante foi o fato de o Brasil ter apresentado uma redução voluntária na emissão de gases do efeito estufa, não prevista no protocolo de Kyoto, na Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas realizada em 2009 em Copenhage.
 
Outra ação importante foi implementada também em 2009, com a criação da Política Nacional de Mudanças Climáticas, que visa elaborar planos contra os impactos das mudanças climáticas para diversos setores da economia.
 
“São avanços importantes, o Brasil caminhou na direção certa. Mas seria preciso muito mais do que isso no que diz respeito à adaptação e ao combate à vulnerabilidade. Nesses pontos, ainda temos muito por fazer”, afirma Saulo Filho.
 
Szlafszstein diz que o governo brasileiro não tem um planejamento estratégico para diminuir os impactos das mudanças climáticas. “Há numerosas intenções e propostas, mas elas se destacam por serem isoladas, com escasso nível de implementação, e por serem orientadas para diminuir as emissões de gases-estufa, com pouca atenção para a adaptação aos impactos das mudanças climáticas.”
 
Além disso, o discurso de preocupação com as questões ambientais é acompanhado por políticas que vão no sentido contrário, como o incentivo à produção de automóveis e à extração de petróleo.
Sistema de alerta
 
A tragédia na região serrana do Rio de Janeiro, em janeiro de 2011, é considerado o maior desastre climático do Brasil. Na época, mais de 900 pessoas morreram por causa dos deslizamentos, que deixaram milhares de desabrigados.
 
Para evitar novas tragédias, o governo federal criou em dezembro de 2011 o Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden). O objetivo do centro de pesquisa é alertar, com até duas horas de antecedência, sobre o risco de deslizamentos de encostas.
 
De acordo com Carlos Nobre, secretário de políticas e programas de pesquisa e desenvolvimento do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), o governo tem a meta – ambiciosa, segundo ele – de diminuir o número de mortos, feridos, desabrigados e desalojados em 80% nos próximos anos. “Com o sistema de alerta, a Defesa Civil pode conduzir um processo organizado de evacuação dos moradores, que podem ir para um lugar seguro. O sistema elabora, diariamente, alertas para todo o país”, diz Nobre.
 
Pensar de forma preventiva
 
Segundo Saulo Filho, é importante agir de forma preventiva e não apenas remediar os erros. Ele cita um estudo do professor britânico Nicholas Stern, ex-economista-chefe do Banco Mundial, segundo o qual ações preventivas são cinco vezes mais econômicas.
 
Saulo Filho afirma que governantes, políticos e até mesmo alguns setores da sociedade ainda resistem em aceitar o tema como prioritário na hora de elaborar políticas e adotar medidas.
“O ser humano quer ter 100% de certeza de que tudo que está ocorrendo com o clima se deve à ação humana. Mas a complexidade do sistema não permite fazer interpretações tão exatas e tão precisas. Isso torna mais difícil convencer os políticos, e essa é uma das barreiras a serem quebradas nos próximos anos”, afirma.
Autor: Fernando Caulyt
Revisão: Alexandre Schossler
Matéria da Agência Deutsche Welle, DW, publicada pelo EcoDebate
 

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