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domingo, 3 de julho de 2011

É o fim do mercado de carbono?

José Alberto Gonçalves Pereira

Com a derrocada na venda de créditos de carbono aos países ricos, nações emergentes como o Brasil perdem algo valioso: um incentivo financeiro para poluir menos

Termelétrica na Inglaterra: a crise na Europa tirou o ímpeto da indústria e derrubou as emissões de CO2 / Christopher Furlong/Getty Images
Ganhar muito dinheiro com ar. É possível? Entre os anos de 2006 e 2008, muitas empresas do Brasil e de outros paí­ses emergentes estavam convictas de que sim.

E tinham razões para isso. Elas estavam faturando alguns milhões de dólares com a venda de créditos de carbono do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), da ONU, uma das peças-chave do Protocolo de Kyoto — tratado assinado em 1997 que determinou pela primeira vez limites para as emissões de gases causadores do efeito estufa nos países ricos.

Funcionava assim: uma companhia brasileira apresentava à ONU um projeto de MDL provando que havia reduzido as emissões de CO2 ao trocar, por exemplo, a matriz energética suja de uma fábrica por uma de fonte renovável. Com isso, ganhava créditos, que vendia a uma empresa europeia ou japonesa que precisava cumprir metas de baixar suas emissões de gases estufa.

Esse comércio entre emergentes e ricos teve seu auge em 2007, quando movimentou 7,4 bilhões de dólares. De lá para cá, porém, o MDL perdeu fôlego, e o que se vê hoje é o ocaso de um dos símbolos da luta contra o aquecimento global.

Segundo um relatório do Banco Mundial divulgado no início de junho, a venda desses créditos gerou apenas 1,5 bilhão de dólares em 2010. Isso representou 1% do total de 142 bilhões de dólares do mercado global de carbono em 2010, que abrange outros tipos de negociação. Entre 2005 e 2007, essa fatia chegou a ser de quase 20%.

O mercado de carbono começou a dar sinais de fadiga em 2008, quando a crise financeira mundial derrubou os preços dos créditos. A crise tirou também o fôlego da indústria europeia, que, ao produzir menos, passou a precisar de menos ajuda dos emergentes para cumprir suas metas de redução de gases estufa.

Foi-se a expectativa e com ela os negócios com créditos de carbono do MDL. “Ninguém sabe o que vai ser do MDL a partir de 2013”, afirma Flavio Pinheiro, diretor da Econergy, consultoria de projetos de carbono da empresa de energia francesa GDF Suez. “Não fosse essa insegurança, desenvolveríamos mais 50 projetos, além dos 71 de nossa carteira atual.”

Sem nenhuma garantia de que os créditos de projetos registrados a partir de 2013 terão compradores, o que as empresas estão fazendo é correr para aprovar seus projetos de MDL na ONU até o final de 2012. Uma das companhias que estão brigando contra o relógio é a ArcelorMittal.

O diretor de meio ambiente global da siderúrgica, o belga Karl Buttiens, esteve no Brasil em maio e deu ordens para a subsidiá­ria apressar os quatro projetos em desenvolvimento. No cronograma inicial, a ArcelorMittal levaria, no mínimo, mais três anos para obter o registro.

Dois desses projetos estão relacionados ao uso de carvão vegetal, em vez de carvão mineral, na produção de ferro-gusa na usina de Juiz de Fora, em Minas Gerais.

A siderúrgica já tem o registro de um projeto de MDL, que recupera gases como o monóxido de carbono produzido na aciaria de Tubarão, no Espírito Santo, para gerar energia em suas termelétricas.

A venda de parte desses créditos ao banco alemão KfW em 2009 rendeu à ArcelorMittal 5 milhões de dólares. Hoje, a empresa negocia com o banco a venda de um segundo lote de créditos do mesmo projeto.

“O MDL tem sido um estímulo para que os países emergentes invistam em tecnologias limpas”, diz José Otávio Franco, gerente de meio ambiente da ArcelorMittal Aços Longos. Dito isso, a questão que se impõe é quanto seu enfraquecimento vai atrapalhar essa trajetória.

“Vamos continuar apostando em processos produtivos mais sustentáveis, mesmo que não possamos contar com o empurrão da venda de créditos do MDL”, diz Franco. É uma visão otimista, que casa com a de especialistas que acreditam na recuperação desse mercado.
Para Carlos Delpupo, da consultoria Instituto Totum, o acidente na usina japonesa de Fukushima e o renascimento da aversão à energia nuclear podem levar a um uso maior de combustíveis fósseis na Europa.

“Esse aumento do uso de energia suja terá de ser compensado em parte com créditos do MDL”, diz Delpupo. É uma hipótese. O que já virou uma certeza para as empresas de países emergentes é que ganhar dinheiro com ar — ou melhor, com créditos de carbono — já foi bem mais fácil.

Até dezembro de 2009, porém, acreditava-se que os governantes dos países do mundo reunidos na conferência do clima da ONU, em Copenhague, na Dinamarca, definiriam um acordo global de redução de emissões para depois de 2012, data em que o Protocolo de Kyoto expira. Mas isso não aconteceu.

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