A questão ambiental nunca esteve tão em voga, ativa em discussões e, como necessidade maior desse início de século, sedento de ações concretas e implementações efetivas tanto nos âmbitos federativos internos (União, Estados e municípios) quanto na esfera internacional/mundial (através dos tratados, acordos, protocolos e convenções que envolvem as mais diferentes nações).
É unânime o entendimento de que uma ação conjunta de todos os atores governamentais e não-governamentais é fundamental para se conseguir trazer à realidade o que for acordado, tratado ou compreendido. O isolamento não é vantajoso para ninguém, muito menos à sociedade mundial que já sofre com os efeitos catastróficos de fenômenos seriíssimos como o aquecimento global, efeito estufa e aumento dos níveis dos mares.
Sendo assim e tendo em mente o advento dos acordos entre nações, podemos sintetizar desta maneira três deles, a saber: Convenção Quadro Sobre Mudanças do Clima, Protocolo de Quioto e Plano de Ação de Bali. Em seguida, trataremos do mecanismo do REDD+ (Reducing Emissions From Deforestation and Forest Degradation) incluindo o papel da conservação, do manejo sustentável das florestas e do aumento dos estoques de carbono das florestas em países em desenvolvimento.
CONVENÇÃO QUADRO SOBRE MUDANÇAS DO CLIMA
A Convenção Quadro Sobre Mudanças do Clima ou Convenção Quadro das Nações Unidas Sobre Mudanças do Clima (United Nations Framework Convention on Climate Change) resulta da criação do Comitê Intergovernamental de Negociação Para A Convenção Quadro Sobre Mudanças do Clima (INC/FCCC) em 1990 pela Assembléia Geral das Nações Unidas. Em 1992, mais especificamente em junho de 1992 durante a realização da Cúpula da Terra (ECO-92, RIO-92, como preferir), foi aberta a assinaturas e vigorando a partir de março de 1994 (após sua ratificação por mais de 50 países).
A CQNUMC não prevê responsabilidades homogêneas ou iguais a todos os países, dividindo-os em dois blocos de nações: Anexo I que são os países desenvolvidos ou industrializados, no Anexo II que constam os países também desenvolvidos, mas que pagam custos às nações em desenvolvimento; além dos famigerados “em desenvolvimento”.
O objetivo maior da Convenção é a efetiva redução dos níveis de emissão de gases de efeito estufa (GEE), estabilizando a concentração dos mesmos na atmosfera, trazendo o desenvolvimento sustentável impedindo a interferência antrópica devastadora (artigo 2). Ao longo dos artigos, incisos e alíneas do texto da Convenção, depreende-se claramente a utilização de diversos princípios, a saber:
- Da responsabilidade comum, mas diferenciada: trata do reconhecimento de que a responsabilidade de proteger o ambiente é comum a todas as nações, porém lembra que a proporção do impacto gerado por países industrializados em relação aos “em desenvolvimento” é maior, além de que a mitigação e o reparo do dano podem ser mais bem realizados pelos primeiros por questões tecnológicas, econômicas e financeiras (artigo 3ª, 1 e 2)
- Precaução: a incerteza científica acerca do dano possivelmente gerado jamais pode ser desculpa para o dano perdurar. Aí entra em cena a precaução como importante garantidor da imediata reparação ou mitigação do problema ambiental (artigo 3ª, 3).
- Desenvolvimento sustentável: entendido como o equilíbrio entre as necessidades antrópicas atuais e as garantias das gerações futuras, entrou na moda da sociedade mundial a partir da transição dos séculos XX e XXI quando foi formulado o conceito e amplamente debatido (artigo 3º, 4).
- Cooperação: pelo fato de uma degradação ambiental poder gerar resultados além das fronteiras de uma só nação, se entende que a cooperação a nível internacional entre elas é fundamental, respeitando sempre suas soberanias (artigo 3º, 5).
Ficou instituída a chamada Conferência das Partes (COP) como órgão supremo da Convenção, uma reunião periódica dos países membros a fim de atualizar diversos aspectos do texto que podem ter perdido sua eficácia pelo decorrer do tempo, tratar dos relatórios e inventários nacionais de emissão antrópicas por fontes e remoções por sumidouros dos gases de efeito estufa que não são regulados pelo Protocolo de Montreal (que as nações se obrigaram em fornecer periodicamente à Conferência das Partes). A cada COP temos, ou não, a introdução de conceitos inovadores, exposição de preocupações, negociações, dentre outros. O artigo 7 trata mais especificamente das COPs e suas atribuições.
Como forma de respeitar o princípio da cooperação, a Convenção destaca a importância do intercâmbio de tecnologias, pesquisas científicas e técnicas socioeconômicas e jurídicas entre países membros; metodologias de educação, treinamento e conscientização das populações (através de programas nacionais, firmando o acesso público às informações sobre mudança de clima e seus efeitos e treinamento de pessoal específico) e formas de preparação ou adaptação às mudanças do clima. Especificamente aos países do Anexo I, compete periodicamente fornecer à Conferência das Partes informações detalhadas acerca das emissões dos GEE para que retornem aos índices de 1990.
Outro órgão estabelecido pela Convenção é o Secretariado, responsável pelo apoio e organização das COPs, elaboração de relatórios sobre suas atividades, garantir a coordenação com os outros secretariados de organismos internacionais, estabelecer mecanismos administrativos internos, dentro outras atribuições mais específicas pelo artigo 8º.
Em casos de controvérsia, a questão deve ser submetida à Corte Internacional de Justiça ou ser resolvida por meio de arbitragem.
PROTOCOLO DE QUIOTO
Entendemos ser de cunho geral a Convenção Quadro das Nações Unidas Sobre Mudanças do Clima, e bem mais específico o Protocolo de Quioto.
Resulta da necessidade de se estabelecer um calendário na redução das emissões de GEE. No que a CQNUMC veio impelir à discussão de maneira geral, lato, estabelecendo diretrizes; o Protocolo de Quioto vem regulamentar e estreitar o entendimento, falando de datas limites e percentuais das tais reduções.
É um componente importante da Convenção Quadro, assinado em Quioto (Japão) em 1997 durante a COP 3 na forma de acordo vinculante. Nessa ocasião, fixou-se em 5,2% o quantum médio. Divide os países-membros em Anexo A e B. O primeiro grupo trata dos gases causadores de efeito estufa (dióxido de carbono – CO2, metano – CH4, monóxido de carbono – CO, óxido nitroso – N2O, outros óxidos de base nitrogenada – NOx, e hidrocarbonos não-metanos – HCNM) que valem as metas de emissão comentadas, bem como os setores da produção que devem diminuí-los. Já o segundo destaca os países-membros do Protocolo (38) e a Comunidade Européia que têm compromisso firmado de reduzir os índices de emissão, bem como os de limitação. O Anexo B é compromissado em reduzir o quantum médio, os da União Européia 8%, os Estados Unidos da América estabeleceu 7% e Canadá e Japão em 6%. Já os países em desenvolvimento não possuem metas vinculantes de redução de emissão, porém se comprometeram em executar planos e programas nacionais com esse objetivo nos setores de energia, transporte, tratamento de resíduos, entre outros; além de realizarem periodicamente os intitulados Inventários Nacionais de GEE e os Relatórios Nacionais a serem apresentados à Convenção.
No mesmo Protocolo, foram instituídos três chamados “mecanismos de flexibilidade” como verdadeiras ferramentas propulsoras que deverão ser utilizadas pelas nações na conquista de suas metas, a saber: a Implementação Conjunta (Joint Implemention) constante no artigo 6º i, Comércio De Emissões (Emission Trading) constante no artigo 17 permitindo a troca das RCEs (Redução Certificada de Emissões) entre nações geradas por projetos de implementações conjuntas e dizem respeito exclusivamente aos países constantes do Anexo B; e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL (Clean Development Mechanism) que nada mais é do que um projeto implementado por um país em desenvolvimento que capture GEE do ar, ajudando na redução dos índices alarmantes, gerando as RCEs que podem ser comercializadas no Comércio de Emissões. Note-se que são três conceitos absolutamente interligados.
Entrou em vigor 90 dias após a ratificação pelos países que representam 55% das emissões de GEE de 1990 no mundo industrializado, o que ocorreu com a adesão da Rússia durante a COP 10 na data de 16 de fevereiro de 2005. Nos dias atuais, o Protocolo já conta com a adesão de 169 países.
PLANO DE AÇÃO DE BALI
Em plena COP 13 ocorrida durante os dias 3 a 14 de dezembro de 2004 em Bali na Indonésia, surge o Bali Roadmap, um documento importante visando acordos internacionais após o ano culminante de 2012.
Trata do Fundo de Adaptação (mecanismo financeiro utilizado para apoiar os países que porventura tenham maiores dificuldades em adaptarem-se às mudanças do clima), lembra da importância de transferência de tecnologias (ítem 1, d), redução de emissões dos gases de efeito estufa (item 1), instituiu um grupo de trabalho ad hoc a fim de estudar melhor possíveis incentivos aos países em desenvolvimento no tocante à implementação de estratégias de mitigação, adaptação e de cooperação tecnológica a longo prazo (item 2).
REDD+
Este instrumento de redução compensada de emissões foi apontado pelo Plano de Ação de Bali como possível de ser incluído em futuros acordos internacionais. A Redução por Desmatamento e Degradação foi adicionado (+) das questões de conservação florestal, do manejo florestal sustentável e do aumento dos estoques de carbono, conforme o Plano.
Na COP 16 (Cancun, 2010) surgiu um maior embasamento do mecanismo, com a definição de um conceito, diretrizes, salvaguardas e regras de implementação ao longo das páginas 34 a 37 do documento relatado pelo grupo de trabalho ad hoc.
O Brasil, assim como diversos países, não possui regulamentação específica de projetos de REDD+ (com exceção do Amazonas), restando às ONGs, sociedade civil, científica, acadêmica, pessoas físicas ou jurídicas atentarem para essa lacuna e, juntos, construírem todo um arcabouço inovador no tocante ao assunto. Mesmo que a idéia de “redução compensada” tenha sido pensada por pesquisadores desta banda do mundo, o país ainda corre atrás de fundamentação do mecanismo. Há um Projeto de Lei (PL 5586/2009) ainda em tramitação no Congresso Nacional que prevê a criação de um sistema nacional de REDD+.
Como exemplos de avanços na formulação de projetos de REDD+, temos a criação do Fundo Amazônia criado por Decreto do Presidente da República e administrado pelo BNDES. É o primeiro instrumento a nível mundial que conta com a captação de recursos com base em reduções quantificadas de emissão, além de contar com o apoio do governo norueguês de U$1 bilhão em até seis anos. Todo o dinheiro arrecadado é direcionado a projetos de prevenção e controle de desmatamento, atividades produtivas sustentáveis e pesquisa na Amazônia; paritário ao Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm) e ao Plano Amazônia Sustentável (PAS).
Em dezembro de 2009 durante a COP 15,o governo brasileiro anunciou a média de taxa de redução dos GEE (36,1% a 38,9 até 2020) além de 80% de redução de desmatamento na floresta amazônica e 40% do cerrado nacional.
No primeiro semestre de 2010, movimentos sociais e ONGS lançaram o documento intitulado “Padrões Sociais e Ambientais para REDD+” a fim de estabelecer diretrizes respeitosas às comunidades tradicionais que vivem nas florestas e à biodiversidade. No mesmo ano, o FIP – Forest Investiment Program selecionou o Brasil como um dos países-piloto dessa plataforma multilateral de financiamento para projetos de REDD+.
Há também a criação do Grupo de Trabalho para Governos em Florestas e Clima (GCF), uma iniciativa multilateral dos Estados do Mato Grosso, Acre, Amazonas, Pará e Amapá com os governos estadunidenses da Califórnia, Illinois e Wisconsin, além de estados da Indonésia.
O Ministério do Meio Ambiente lançou na internet o Portal REDD+ Brasil, um verdadeiro processo participativo juntamente à sociedade civil, reunindo projetos, informações e ações.
Por último vale ressaltar o encontro no Fórum de Governadores da Amazônia em que nove desses governadores assinaram uma carta ao Presidente Lula e confirmam o apoio ao desmatamento zero e à criação de um mecanismo de REDD+ no país, criando também uma chamada Força Tarefa em REDD+ e Mudanças Climáticas.
Note-se que ainda há muito que avançar nacionalmente (com o apoio subnacional) e principalmente a nível internacional. A controvérsia não é salutar nesse contexto que, o ideal, seria ocorrer a homogeneidade de opiniões em prol do bem maior que é a vida (e sua continuidade), meio ambiente e relações humanas.
Caminhemos a esse fim.
Por Fábio R. Jorge (Belém/PA)
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César Torres